segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Critério Algum

Acredito que o significado do amor nada tem haver com sentimento, mas sim com atitudes voluntárias direcionadas em favor de alguém. Ou seja, amar é agir. A pergunta que não me deixa em paz neste momento é “quem nós amamos?”.

Meu pensamento é que amamos os bonitos, os competentes, os que falam bem em público, os ricos, os esbeltos, os famosos, os líderes, os charmosos, os diplomados e os doutores. É mais fácil dedicar atenção àqueles que fazem por merecer ou que despertam em nós aquilo que nos interessa.

Amamos as qualidades, aquilo que nos interessa. Deve ser por isso que uma gafe, uma barbeiragem no trânsito, um tropeço em público, uma desafinada ou um erro grosseiro nos causam tanto embaraço. Essas coisas nos roubam a capacidade de ser amado pelos outros. Lutamos constantemente para manter o encantamento. A velhice e a doença são sempre as coisas que mais tememos, porque são os principais antagonistas de nossas competências e charme. Nossa aparência é sempre muito mais preservada do que nossa essência.

Creio que não amamos os feios, os desastrados, os desqualificados, os moribundos, os chatos, os burros... Dedicamos a eles no máximo um pouco de nossa piedade. Não há nada que nos interesse numa estirpe de gente sem talento, sem beleza ou sem dinheiro.

É a partir deste pensamento que começo a entender o porquê que Deus revelou o evangelho a gente humilde, iletrada, simples, pecadora. Jesus esteve entre gente desprovida de intelecto e de expertise. A mensagem divina foi entregue a uma categoria de pessoas sem qualquer qualidade especial.

Nós, que entendemos que para amar devemos ter uma espécie de crivo para distribuir o amor às pessoas, devemos perceber que o critério distributivo do amor de Jesus era não ter critério algum.

Deus deixou claro que todo o esforço e todo o charme que insistimos tanto em cultuar não significam nada. Ele confiou a gente humilde e cheia de defeitos sua mensagem e muito mais que isso, deixou essa mesma gente encarregada de transmiti-la a todos os confins da terra. Se Deus fosse premiar alguém por suas competências, não premiaria ninguém.

A única qualidade que Deus espera que tenhamos é a capacidade de amar os outros. Entendo que Deus age da seguinte maneira: ninguém merece amor, por isso todos precisam receber.


sábado, 26 de dezembro de 2009

Deveria Eu Ser Um Católico?

No novo testamento a palavra GRAÇA é empregada para referir a irredutível e desconcertante benevolência de Deus para conosco, ainda que nós sejamos e permaneçamos pecadores, patifes e canalhas. Garante a palavra de Deus que é pela graça, isto é, por bondade divina e não por mérito nosso, que recebemos perdão e salvação deste nosso estado maldito de pecado.

É pela graça e não por algum critério de seleção, que Deus faz derramar a chuva sobre justos e injustos. E é pela graça que as suas misericórdias renovam-se a cada manhã. É pela graça e não por teste de paternidade que Deus nos chama de filhos e permite que nós o chamemos de Pai. É pela graça que Deus oferece uma infinidade de perdão a cada ciclo de tempo e o mesmo procedimento requer de seus filhos.

Paradoxalmente, os protestantes interpretam-se como grandes e credenciados defensores da graça, mas efetivamente são os católicos (muitas vezes tidos como antagonistas dos protestantes) os únicos cristãos a desfrutar graciosa e adequadamente dela. É um item que, em minha opinião, tem riscado o verniz da história do cristianismo ocidental. A característica mais singular da graça, e é isso que me faz pensar sobre tal paradoxo, é o fato de que não há nada que se possa fazer para merecê-la: não se pode barganhar ou extorquir aquilo que Deus se dispõe a oferecer gratuitamente. Essa novidade torna obsoletas todas as mais consagradas práticas religiosas, como ofertas, sacrifícios, promessas, penitências e procedimentos.

O discurso da reforma religiosa foi que a Igreja Católica havia perdido a graça de vista, pois ela estava construindo um império fundamentado na venda de privilégios e na institucionalização. Havia a acusação de que os católicos haviam dado as costas para a mensagem de Cristo, que afirmava não haver sacrifício no mundo que pudesse adquirir perdão ou penitência que pudesse apagar a culpa. A graça era a encarregada de tudo isso. Para os protestantes, os católicos haviam reduzido o cristianismo a um ritual sem vitalidade, pois haviam se esquecido da graça, e por isso eles estavam dispostos a dedicar suas vidas na correção deste desvio. Só que nos últimos séculos, percebo que são os católicos os cristãos mais competentes a desfrutar integralmente da graça, enquanto os protestantes se encarregaram de transformar o cristianismo em ritual e instituição.

Eu, como protestante, digo de peito aberto que resta-nos o discurso e cabe aos católicos toda a herança. Parece inevitável que sempre adquirimos as características daqueles que refutamos. Vou tentar exprimir em palavras meu ponto de vista.

Os católicos entendem que a igreja não é contida por templo algum, ainda que existam templos católicos em todo lugar do mundo (verdadeiro sonho de consumo protestante), e de certa forma entendem que nada neste mundo tem como dar errado. Ou seja, se a Igreja está em todo lugar, Deus está em todo lugar e também o serviço cristão. Os católicos enxergam a igreja não como um lugar, mas como uma condição de segurança e de acesso a Deus, algo muito semelhante ao que Jesus descrevia como sendo o reino de Deus.

Os católicos estão muito mais dispostos (e percebo isso na pele) a receber os pobres, os doentes, os deformados, os divorciados, os travestis, os aidéticos, os viciados, os mendigos, os maltrapilhos, os bêbados, os fedorentos e os rejeitados de todas as estirpes, do que qualquer vertente protestante. Qualquer igreja católica tem a maturidade suficiente de receber um destes excluídos sem exigir nada em troca pelo oferecimento gratuito do perdão e do acesso a Deus.

Ao contrário de nós protestantes, os católicos vão à missa e não à igreja, pois esta é terreno santo e onipresente do qual não há como escapar. E se Deus está em todo lugar, sua proteção é imediatamente acessível, seu poder é inevitável, seu favor é onipresente. Deus e a vida podem ser celebrados adequadamente em qualquer lugar, fora das paredes do templo, porque não há como fugir da segurança da igreja, que é outro nome para o entendimento do reino de Deus. Coitados de nós, protestantes, se a palavra igreja não se tornar relevante novamente, se não se tornar algo de extrema importância nas nossas vidas. Para nós, protestantes, a igreja é um local definido e também uma atividade. A palavra igreja soa como lugar-comum, algo indiferente, que não faz o coração bater mais forte. Associamos igreja a atividades, compromissos devidamente agendados e muito bem organizados. Consideramos que quem faz mais é mais espiritual.

Percebo claramente que a palavra igreja quando ouvida por um católico, acende todos os seus sentimentos de amor, de cuidado e de bem-aventurança. Essa palavra desperta nele os sentimentos que só uma criança pode nutrir com relação à sua mãe: gratidão, reverência, respeito e amor sincero. Algo semelhante ao sentimento que toma conta de uma pessoa quando, depois de uma longa ausência, retorna ao lar de sua infância.

Os católicos têm as suas novenas, suas velas, suas promessas e seus sacrifícios, mas recorrem a eles e deixam-nos lá, em paz. Retornam para as suas casas e vivem as suas vidas como gente normal, confiados na improvável graça como um cristão verdadeiro deveria fazer. Não vêem a necessidade, como nós protestantes, de reacenderem seus sacrifícios incessantemente, domingo após domingo pela eternidade. Não há exclusão numa igreja católica, pois nem mesmo vêem necessário criar um rol de membros. Os católicos não vêem a necessidade de dar evidência do seu mérito pela atividade incessante, pelo acúmulo insano de conhecimento e pelos ajuntamentos febris.

Nós protestantes somos imbecis, pois adoramos atividades infinitas, diplomas e graduações, números de vendas e rol de membros. Os protestantes adoram números, balanços, resultados positivos – adoram contar vantagem. O número de famosos no meio católico se comparado com a realidade do meio protestante é irrisório.

Os católicos têm as suas repetições, mas podem recorrer a elas em oculto, na privacidade das suas casas. Têm as suas imagens, mas não se rebaixam com a mesma facilidade ou as mesmas desculpas que nós damos à ganância, que é nossa idolatria. Eles têm os seus santos, mas preferem beijá-los a sustentá-los com dinheiro, como fazem nós, os protestantes. O pior é que seus santos são gente simples como eu e você, que buscaram verdadeiramente a face do Deus vivo.

Nós, protestantes patifes que somos, temos os santos mais carolas, obtusos e bandidos do mundo, os quais vivem como marajás em seus palácios. Os católicos têm as suas penitências, mas conhecem o arrependimento. Tem as suas peregrinações, mas não se rebaixam na idiotice de seguir todos para o mesmo lugar.

Se somos nós os religiosos, porque deveríamos ser os que mais tagarelam sobre a graça? Para nós a igreja é um local e uma tarefa; para o católico é uma segurança e um estado de espírito. Para nós a graça é um conceito importante; para um católico é estar vivo.



quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Patife

Hoje ficou claro pra mim que sou um patife, uma farsa, um safado. Considero-me assim e com certeza alguns de vocês dirão que já estava na hora de eu me reconhecer.

Sou um camarada raso – sem profundidade alguma. Muito marketing e pouco conteúdo. Se comparado com as pessoas que me cercam, não possuo quaisquer sinais de maturidade ou equilíbrio emocional.

Muito disso pode ser percebido na forma como trato as pessoas. Passei muito tempo dizendo que nada me é mais importante do que as pessoas em detrimento do mundo material, mas nunca consegui deixar prova concreta deste meu perfil. Jesus, o Filho do Homem, anunciou que até os pecadores tratam bem os seus amigos – nem isso eu consigo fazer. Eu trato mal aqueles que me amam.

Nunca consegui retribuir na mesma medida o carinho que recebi de pessoas como o Jackson, o Edu ou o Hermann. Nunca sequer retribui a admiração dispensada em meu favor como a que o Jorginho ou o Maico tem constantemente por mim. Isso sem mencionar tudo o que recebi da Renata ou da minha mãe e que, como safado que sou, nunca soube agradecer.

Sou um patife. Um camarada como eu suga toda a atenção que meus amigos e amores me dão, e só dou aquele carinho básico de retorno para manter minha imagem de bom moço, de menino bonzinho, de um sujeito agradável. Sou uma farsa.

Recordo-me neste instante que disse inúmeras vezes que “não há amor maior que dar a vida por seus amigos”, tentando ser um imitador de Cristo. Mas, sempre foi da boca pra fora, pois na essência das minhas atitudes, sempre foi no sentido de ser um amigão, aquele que dá suporte. Em outras palavras, eu sempre me coloquei numa posição privilegiada de conselheiro ou de quem cita as palavras de Jesus com certa destreza, ao invés de me colocar no lugar das pessoas.

Eu posso abraçar e beijar as pessoas, posso oferecer carona e carinho, posso emprestar dinheiro ou fazer juras de amor eterno, mas não tenho envergadura moral para me identificar com elas.

Passei a conviver naturalmente com as mentiras que contam a meu respeito, afinal eu sou uma fraude. Estou me referindo ao fato de pessoas afirmarem coisas boas ao meu respeito como meu amor ou minha gentileza. Porém, eu não amo ninguém como devo e não sou nenhum pouco gentil. Sou uma verdadeira tentativa de ser algo bom – mas, uma excelente farsa, um perfeito canalha.

Quando dou algum presente, tal atitude carrega na alma a idealização de receber mais fama ou atenção. Sou uma sanguessuga. E pra ser honesto, raramente dou presentes. Fico dizendo que não sou apegado a coisas materiais para fugir da realidade de minha negligência. Esqueço que o desapego é espiritualmente medido pelo quanto se dá, e não pelo pouco que se tem.

Para aumentar ainda a ferida causada pela minha canalhice, recebo tratamento maravilhoso das pessoas. Levo a vida de um rei. Sou elogiado, sou amado, sou querido, sou paparicado, sou bem quisto. Até hoje, ninguém me tratou como realmente mereço – eu sou uma farsa, um canalha, um patife, um ingrato.

O mal que não quero, esse sim, eu faço. Enquanto o bem que todos fazem e que afirmo a todos os pulmões ser a coisa certa a fazer, não faço coisa alguma para realmente faze-lo.


sábado, 7 de novembro de 2009

Solidão

Às vezes eu sinto uma dor no peito, uma angústia inexplicável. O choro é manifesto quase que em seqüência e muitas vezes me encolho no sofá, apertando os dedos das mãos junto ao coração. Nem sei por que isso acontece. Simplesmente vem essa tristeza e quando percebo, estou envolvido numa solidão sem tamanho.

Eu gosto de ficar sozinho. Sou esquisitão. Nestes instantes de abandono, seleciono uma música saudosista, e passo a refletir na melodia e na poesia da canção. Os olhos se enchem de lágrimas ao som dos quatro rapazes de Liverpool. Fico imaginando um mundo de sonhos, onde sou um homem realizado, satisfeito com o que produzi e percebendo que muitos dos que eu dediquei carinho e atenção, sabem retribuir.

Tem dias que não me sinto empolgado com nada, não me sinto confiante em nada, e minha estima chega a aproximar-se do zero. Passo a detestar meu corpo, judiado pela obesidade e pelo sedentarismo. Arrumar-se é quase que uma tortura de campo de concentração: calças e camisas roubam-me a força do sorriso. Nada me serve confortavelmente.

Não sou idiota. Ser magro ou possuir um corpo atlético não me livraria de nenhum dos meus momentos de tristeza, porque nem sei de onde eles vêm. Entendo perfeitamente que minha vida não possui blindagem alguma, e que toda a pancada que vier na minha direção me acertará em cheio se eu não me desviar.

Sinto o gosto do fel do abandono, feito o companheiro que percebe o amigo desviando o passo para não cumprimenta-lo publicamente. Eu tento não passar por momentos assim, mas continuo muito tosco; fico magoado por pouca coisa, abro espaço pro silêncio, e a introspecção aparece feito velha amiga.

Assim vou levando minha vida: tropeçando nos cadarços, cambaleando feito cego em tiroteio, tateando a porta para encontrar o buraco da fechadura. Confesso que tenho medo do abandono, mas percebo que a solidão me cai bem.


terça-feira, 20 de outubro de 2009

Mensagem ao meu Irmão

A vida é um verdadeiro vôo livre paralelo a um paredão de rochas pontiagudas. Os corajosos aproveitam melhor a aventura, pois a encaram como esporte radical. Sentem-se felizes com a adrenalina pela proximidade de chocar-se contra o lajeado. Os conservadores preferem um ritmo lento, ralando os dedos e os joelhos, pois entendem que é melhor descer à montanhista. Poucos são os que se atiram de ponta, abrindo os braços e desatando o nó da garganta.

Já vi gente prometendo uma vida sem problemas. Eram pessoas que afirmavam que Deus agiria em favor dos seus, transformando as dificuldades em céu de brigadeiro. Já não engulo mais a ladainha de que as tristezas e pressões do dia a dia são fruto do pecado e da pouca fé. Minha crença é que a vida esbofeteia a todos sem qualquer distinção. Tudo o que temos e recebemos são resultados de escolhas individuais, tanto nossas quanto de terceiros. É impossível correr da tristeza.

A motivação perde o pique com as ferroadas, a força amolece pelos coices, os sonhos se esvaem com os furacões. Os dias têm sido muito frios e as noites longas demais. Valentes de outrora se tornaram anciãos fatigados. A vida empurra todos ao mar adentro e não adianta nadar contra a maré.

A vida é dura, mas não é isenta de felicidade. Ser feliz é muito mais que livrar-se dos problemas. Alegria é muito mais que dinheiro no bolso, prato cheio, feriado prolongado e festa de aniversário. Os dias são maus, mas não impede a força da bondade – cabe a cada um promovê-la. Cada um por cada um.

Não creio que Deus esteja lá em cima salpicando adversidades para nos testar. Não consigo entender propósito nas durezas de uma pessoa sendo diagnosticada com câncer enquanto ao mesmo tempo tem gente esbanjando sossego, fruto de corrupção. Não aceito a explicação que Deus tem encolhido sua mão para alguns e estendido para outros. Será que ele permite que uma mulher abandone o lar, o marido e os filhos simplesmente para provar a fé da família?

Quando converso com Deus e comento sobre as dores dos dias, desabafando e revelando minha tristeza e indignação, percebo claramente que o plano dele não é o livramento. Deus quer que busquemos as coisas de cima, coisas que vem dos céus. Quer que sejamos nobres ao enfrentar com confiança tudo quanto é tristeza que venha pela frente. Buscar livramento é mediocridade diante de tanta coisa boa que existe por aí.

O coração azeda quando relutamos contra traições, abandonos, chifradas, chutes, temporais e cara feia. Mais vale queimar fosfato com as coisas simples e gente amiga. Melhor ainda é poder oferecer carinho e respeito sem ter qualquer retorno previsto.

Basta a cada dia o seu mal e qualquer esforço para enfrentar mais que isso é enfadonho. Enquanto engolimos sapos pelo caminho, cicatrizamos as feridas e desviamos os pés das topadas, as flores desabrocham, os pássaros cantam, os filhos abraçam e as mães sorriem. Melhor é fitar os olhos nisto.

Bem aventurados são os que choram, porque todos serão consolados.

domingo, 18 de outubro de 2009

Silêncio Amigo

Ultimamente venho sentindo uma angústia, um aperto no peito. É uma espécie de tristeza que vem de leve, que me deixa pensativo e taciturno. Em alguns momentos do dia prefiro ficar calado, pensando sobre meus dias e minhas escolhas. Tenho feito opções mais solitárias simplesmente para pensar e chorar.

Minhas reflexões me deixam tranqüilo quanto a tudo isso. Não estou afastado de Deus ou com um pesado fardo na consciência. Não estou devendo nada a ninguém, não fiz maldade alguma e não estou com grandes motivos para tal angústia.

Reconheço que minha vida é boa. Tenho uma situação privilegiada se comparada com a maioria das pessoas (o que não me coloca em destaque e nem deve) e o saldo é sempre de gratidão. Acontece que de vez em quando o coração dói, a alma fica murcha e o peito mingua. A vida fica um pouco mais cinzenta em momentos como este.

Tem horas que me sinto feito um zumbi que tateia as paredes procurando a saída do cemitério. Meus dias têm demonstrado alvoradas precoces e minhas noites tendem a me exigir um pouco mais de ânimo. A vida tem se tornado monótona demais e todas as minhas iniciativas e projetos tem tido baixíssimo aproveitamento. Quando há oportunidade de fazer aquilo que amo, o tempo tem sido inimigo.

Acho que é um pouco de cansaço. Entendo também que estou frustrado com meu trabalho. Gostaria de estar fazendo algo totalmente diferente. Mas, percebo que o silêncio tem sido um excelente facilitador de entender tudo isso. Pensar sobre a vida tem me permitido enxergar o que fazer para ter um futuro interessante. Tem valido a pena ficar quieto e pensar sobre mim.


quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Grande Paixão

Eu sou um apreciador de música de qualidade. Deus colocou os ouvidos muito próximos do cérebro e por isso acredito que é insalubre ouvir algo que não seja artisticamente bem feito.

Algumas canções são desconcertantes. Invadem a alma e a povoam de sonhos e saudades sem fim. Músicas que eu ouvia quando criança, como as trilhas sonoras internacionais de novelas ou as executadas nas propagandas da Hollywood, são as que mais trazem boas lembranças e me enchem de alegria. As músicas dos Beatles fortalecem-me no caminho da arte e da inovação.

Lembro-me que praticamente todos os sábados pela manhã meu pai e eu investíamos tempo para lavar o carro. Enquanto a tarefa era executada, deixamos o rádio sintonizado nas FM’s, saboreando cada faixa a cada minuto. Talvez seja por isso que a música pop dos anos 80 me seja tão familiar e saudosista. Artistas como Tears for Fears, A-ha ou Alan Parsons Project foram responsáveis por um percentual de minhas inclinações sonoras.

Existem canções que me roubam a fala, que trazem muito mais que boas lembranças. São músicas que me aproximam mais daquilo que realmente tenho grande paixão em fazer. Trata-se de canções que habitam meu coração e que praticamente já se tornaram parte do que sou. Músicas como My Sweet Lord do George Harrison, God Only Knows do Brian Wilson ou Dear Prudence dos Beatles são exemplos do que estou falando.

A música é um agente de transformação. Meu humor muda simplesmente com algumas melodias contagiantes. Como permanecer triste ao ouvir September do Earth Wind and Fire? Como não sentir a tristeza em Trocando em Miúdos de Chico Buarque? Como não sentir falta das canções de John Lennon?
Quem me dera poder apenas fazer música na vida!

domingo, 11 de outubro de 2009

Misericórdia Sufocada

Assisti há poucos minutos uma entrevista do Renato Russo, onde ele falava sobre a questão do homossexualismo no Brasil. Percebi certa confusão de pensamentos, apesar da grande inteligência que possuía, que levaram-me a um ponto de reflexão: as ações de misericórdia foram categoricamente sufocadas por legalidade.

O que penso sobre este assunto [e não estou falando sobre homossexualismo] é que o legalismo imprimiu determinada guerra entre misericórdia e o que podemos chamar de ordem da criação.

Para mim, a organização parece ser uma característica fundamental e do universo, ou seja, do próprio Deus. Basta ler o relato da criação no livro de Gênesis, onde tudo é metricamente criado, em sua ordem e previsão. Tal ordem da criação tem sido a essência da defesa dos cristãos. Afinal, a determinação de domínio da humanidade sobre as demais criaturas, a instituição da família e do casamento, tudo isto é relatado no Gênesis.

O mundo como Deus o criou está firmado em categorias fixas e violá-las é entregar o mundo ao caos. Mas, meu raciocínio é que os cristãos assumiram um posto de defesa tão belicoso, que esqueceram das ações de misericórdia, amplamente divulgado por Jesus Cristo, e desta forma afastaram-se de todo e qualquer plano divino. Enfim, deixo logo abaixo meu pensamento de forma exaustiva.

O primeiro aspecto que tenho em mente é que a retaliação contra a mulher é sempre firmada na ordem da criação. Adão veio primeiro, e a mulher foi criada para o homem; o marido é a cabeça da esposa; a mulher veio do homem, e não o homem da mulher. E tendo conhecimento desta ordem, a igreja impediu a ascensão da mulher ao ministério e sacerdócio em igrejas cristãs de todos os matizes.

Muito mais que impedi-las de crescimento social, à mulher foi concedido o posto de criatura de segunda classe. Ainda que não fosse assim criada, na ordem da criação ficou estabelecido que ela devia agir como se fosse.

Não só as mulheres sofreram com os cristãos. Os negros sofreram humilhações ainda maiores, pois sua dignidade foi arrancada com chicotes e pólvora. Por mais de 18 séculos a escravidão foi utilizada como forma de atividade econômica, sendo pacificamente aceita pela igreja.

A desculpa esfarrapada dada pela igreja para tamanha crueldade é que os negros eram descendentes do filho amaldiçoado de Cão, filho de Nóe, que fora condenado a servir seus irmãos. Tal panacéia foi amplamente promulgada no continente africano, sendo descrita como “sancionada em ambos os testamentos, utilizada em todas as épocas e encontrada nos países com maior desenvolvimento econômico e artístico”.

O Novo Testamento não oferece uma palavra de condenação à escravidão; ao contrário, em muitas passagens parece sancioná-la sem encontrar na questão qualquer dilema moral. Para os abolicionistas justificarem biblicamente sua posição era tarefa difícil, enquanto que os escravagistas tinham dúzias de versículos em seu favor. Dispor-se a lutar pela abolição era, em grande medida, dispor-se a lutar contra a Bíblia.

Houve pastores que anunciaram não existir motivos para casamentos entre raças, já que Deus criou brancos, negros, malaios, amarelos e vermelhos, e colocou-os em continentes separados, conforme a ordem da criação.

Meu raciocínio encontra ainda mais pérolas. Enquanto a Alemanha nazista avançava sobre tudo, em especial sobre os judeus e os classificados como sub-raça, o que a igreja estava fazendo?

Membros das igrejas européias anunciavam que a vontade divina expressa na lei era demonstrada por ordenanças claras e invioláveis que governam a vida das nações. Ou seja, para ser cristão genuíno era necessário ser patriota, e todo bom patriota não se posiciona contra as decisões de seu governo. Se assim Deus estava permitindo através dos governantes, quem seria eu para ir contra? – pensava a igreja.

Desta forma, todos os campos de concentração e todas as bombas foram aceitos, já que tudo era ocorrido por permissão divina. A igreja além de não se manifestar, engoliu em doses cavalares a crueldade com justificativas banais.

Nesta verificação pelas as atas da história, encontramos atitudes contra as mulheres, negros, judeus, ciganos e ademais. Mas, numa análise da contemporaneidade, percebo que o alvo são os homossexuais – pensamento que originou todo o escrito deste texto.

Não há espaço algum para os homossexuais nas igrejas. É aceito e bem recebido nos salões das igrejas, desde que bem arrumado e com dízimo saliente, o mentiroso, o lascivo, o estelionatário, o divorciado, o adúltero, o mesquinho, o fofoqueiro, o violento e o invejoso. Mas, não há lugar algum para o homossexual. Nesta terra tenho visto pouquíssima gente disposta a ouvi-los, a abraçá-los, a desejar dividir o pão com eles. Para ser mais exato, só encontrei duas pessoas até hoje com tal disposição cristã.

Enfim, todo este meu esforço de escrever sobre esta guerra existente entre a misericórdia e o legalismo cingido pela ordem da criação, leva-me as seguintes conclusões:

[1] - A igreja em maioria de efetivo e tempo esforçou-se em utilizar as escrituras como meio de justificativa de seus pensamentos, impulsos, procedimentos e conquistas econômicas.

[2] - A igreja tornou-se categoricamente uma instituição repleta de regras de conduta, cada item tendo sua severa punição, e desta forma, tudo quanto é “não conforme” não é passivo de receber graça e está muito longe de alcançar o reino dos céus.

[3] - A igreja não demonstrou seguir o ministério simples e libertador de Jesus Cristo, aquele que afirmou vir para salvar os pecadores, que o reino dos céus pertencia as criancinhas, e que agiu como salvador de mendigos, gays, adúlteros e puxadores de fumo de seu tempo.

Concluo que, eu como seguidor de Cristo e membro de uma comunidade protestante, devo pedir perdão a todos os que um dia foram marginalizados pela formalidade da igreja cristã.

Declaro aqui meu pedido de perdão às mulheres que foram proibidas de proclamar a palavra de Deus; meu pedido de perdão aos negros que foram utilizados como mão-de-obra escrava, proibidos de serem simplesmente humanos; meu pedido de perdão aos povos de outras raças, que foram diminuídos e humilhados por suas aparências e costumes não semelhantes; meu pedido de perdão aos homossexuais que não foram acolhidos e ajudados nas noites de frio e solidão.

A todos vocês que um dia foram considerados não aptos da graça de Deus, meu sincero perdão! "A misericórdia triunfará sobre todo juízo". Tiago 2:13.

Gratidão

Dia 09 de outubro, a última sexta-feira que passou, foi o aniversário da minha primogênita, a minha filha branca de cabelos cacheados. Michelle fez 3 aninhos e a cada dia que passa eu me sinto mais orgulhoso.

Nesta sábado, dia 10, comemoramos com muita alegria não só o aniversário da Michelle, mas como também da Nicolle, minha caçula, que fez anos no dia 26 de setembro. Nicolle é a minha filha preta, com cabelinho cheio de caracóis. Ela fez um aninho de vida.

Agradeço a Deus a oportunidade de ser pai. Agradeço de todo o coração a Jesus Cristo pela graça de ser pai de duas meninas lindas, que nasceram uma seguidinha da outra, permitindo e exigindo um amadurecimento muito grande da minha alma.

Somente a Deus seja a glória!

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Minhas Pretenções

Nunca fui um aluno exemplar. Tirei sempre notas medianas, não ganhei qualquer concurso de redação ou matemática, e minha reputação era sempre de um aluno distraído demais. Na época do ginásio, quando estava me tornando um adolescente, troquei esta distração pela algazarra e fui suspenso algumas vezes.

Entre os 12 e 18 anos, apaixonei-me quase um milhão de vezes levando fora em mais de 90%. Nesta mesma época, adquiri mais peso do que devia, troquei o basquete pelo violão, e viciei-me em fast food. Como resultado, descartei qualquer possibilidade de ser um referencial de boa aparência – se isso foi possível um dia.

Sempre ouvi dizer que músico no Brasil morre de fome e que músico curitibano morre ao nascer. A partir dos 18 anos, este era o meu paredão de fuzilamento, pois não tinha nada neste planeta que idealizasse como paixão ocupacional que não fosse música.

Para piorar, nunca fui um músico talentoso ao ponto de angariar qualquer reconhecimento ou colocação profissional. Não tinha bons equipamentos, não lia partituras, não tinha competências operacionais para atuar um estúdio, não tinha bons contatos e não recebia boas indicações. Ainda que eu fosse habilidoso e tivesse um “ouvido bom”, o máximo que consegui foi tocar numa bandinha de garagem bem divertida.

Hoje, minha situação não é muito diferente. Sou obeso (meu peso tem sempre três dígitos), deixo a mostra o couro cabeludo no cocuruto pela calvície, minhas notas estão sempre na linha média.

Este blog possui indagações teológicas (estou correndo de qualquer teologia, muito menos de propor alguma), e desta forma pode levantar alguns questionamentos dos leitores. O que posso dizer é que não tenho a pretensão de tornar-me um rival dos inteligentíssimos mestres da teologia fundamentalista. Eu sempre levo homéricas lavadas quando eles rechaçam quaisquer dos meus argumentos. Eu sou inapto para fundar qualquer escola de pensamento ou movimento religioso – não tenho cacife para tal coisa (entenda-se prazer).

Por ser um tagarela e bem-humorado, sempre expus abertamente os meus insights. Também nunca me acomodei com o que sabia e nunca me associei com mediocridade. Fiz inimigos, gerei constrangimentos e acabei antipatizado por muita gente por expor uma opinião forte e truculenta, parecendo um elefante trombeteando.

Sei que também fiz adeptos e inspirei algumas pessoas. Peço àqueles que me odeiam misericórdia, pois não sou tão desequilibrado e perverso quanto dei a entender. Aos admiradores, imploro que não me sigam e não me idealizem: escondo uma tonelada de defeitos debaixo da pele.

Você deve estar se perguntando: se sou tão estabanado e vivo dando braçadas na rotina, qual é a minha pretensão afinal? Qual é a minha luta e busca?

Vou passar por esta vida apenas uma vez e, mesmo atabalhoado, quero contribuir de alguma forma para um mundo melhor. Tão somente quero oferecer-me como amigo e dar o ombro aos cansados, dividir o pão e o teto com pobres e aflitos. Quero uma vida sem estardalhaços, sem messianismos e sem falsidade.


terça-feira, 6 de outubro de 2009

Impunidade

Estou mal.

Neste final de semana que passou, assisti a uma palestra que alertava os pais e os jovens sobre a maldição da pedofilia. Slides coloridos revelaram os números das crianças mortas, maltratadas e marcadas para sempre. Foram números que me trouxeram à náusea, pois uma maioria esmagadora trata-se de casos com o consentimento e omissão de pais e mães.

Dados estimados pelo FBI e pela Interpol enunciaram que a pornografia infantil movimentou cerca de 5 bilhões de dólares em 2005, e já é estimado mais de 10 bilhões para este ano. Há um numerador ainda pior: existe apenas UMA AUTORIDADE MILITAR atuante no Brasil na luta contra a pedofilia. Tal pessoa foi a palestrante.

Fiquei ainda sabendo informações ainda mais desgraçadas. Não existe nas leis brasileiras uma punição específica ao crime de pedofilia, para ser ainda mais enfático, pedofilia não é considerado crime – não está diretamente tipificado. Os autores de violência sexual contra crianças não são punidos por tal ato, já que não existe um tipo penal específico para o assunto.

Outra lacuna maldita da lei é que a posse de material pornográfico infantil também não é crime tipificado, ou seja, pessoas que forem flagradas armazenando conteúdo com imagens infantis não podem ser presas.

Quer desgraça maior que isso? Pois bem...

A não tipificação penal tem facilitado a impunidade. Conforme a expertise da palestrante, o pedófilo, normalmente, não tem antecedentes criminais, possui residência e trabalho fixos. Desta forma, ele pega a pena mínima, comporta-se bem e sai com um terço da pena cumprida. A partir daí, leva um tempo de apenas 48 horas para ele agir novamente, conforme as estatísticas apuradas, afirmou o palestrante.

A dificuldade em punir o pedófilo está no fato de que o delito cometido não admite punição para tentativa. Os pedófilos deixam de ser punidos por [pasmem!] falta de conclusão do delito.

No Brasil, para punir o pedófilo é necessário se valer de outros crimes já tipificados pelo Código Penal, como estupro, atentado violento ao pudor, presunção de violência, lesão corporal, corrupção de menores e, quando for o caso, homicídio.

Impunidade: há desgraça maior do que esta? Haveria na terra motivo maior para perder o sono? Tudo isto me deixou muito mal.
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Calado e Sumido

Amigos e parentes já me perguntaram por que eu ando tão calado e sumido. Muito já ouvi nestes seis últimos meses que eu já não sou como era. Embora a conotação seja em tom de tristeza por parte de alguns, nenhuma interjeição me deixou intrigado ou abatido. Eu realmente fico agradecido por tais comentários.

Quanto ao calado, que ouvi umas cinqüenta vezes, eu digo que não é verdade. Ainda continuo falante, exagerado, precipitado e eloqüente como nunca. Sou comunicativo e o calcanhar de Aquiles desta qualidade é minha impulsividade para falar. Digo aos amigos que sentem falta do quanto eu falava (se isso realmente diminuiu) que é bem melhor calar do que replicar por tudo.

Quero dizer aos que afirmam que eu ando caladão e mal-humorado, que eu carrego uma quietude bem resolvida. Vez por outra, prefiro manter-me taciturno, escolhendo sombras ao invés dos holofotes, o ostracismo ao bate-papo, o pensamento à fala. Tudo isso porque estou reavaliando meu dia-a-dia, minha fé, minha história. Ando desapontado com a História. Estou inconformado, relutante em aceitar o que anda acontecendo, quero mudá-la. Mas, isso eu tratarei em um texto mais oportuno.

Mas, em relação ao sumido a coisa é bem diferente. Há algo que se deve questionar sobre este tema: sumido em relação a quê? A resposta eu entrego de bandeja agora mesmo.

Se eu estou sumido dos encontros e das visitas é porque a faculdade e as crianças tomam meu tempo e com todo o direito do mundo. Deixei para estudar tarde (mas, não tarde demais) e com isso tenho uma sobreposição de horários na agenda: família, trabalho e estudo. E as meninas não precisam ter horário previamente agendado: a elas esforço-me sobremaneira para estar sempre disponível para o momento. Não há nada melhor do que estar sempre disponível – tanto para mim como para elas.

Para o parágrafo acima, concluo que estou sumido por uma simples questão de prioridades, que em breve se encaixarão em outros padrões, os quais eu espero menos consumo do tempo, sobrando assim, condições favoráveis para estar disponível também aos demais amigos. Assim espero.

Porém, se a sua indagação foi com relação a “sumido da igreja”, antecipo que não há nada com o que se preocupar. Não estou afastado porque não deixei de ser igreja. Se não nos vemos, é porque há algo errado com nosso cristianismo, já que se trata de uma fé relacional, de compartilhamento e de comunidade. O cristianismo nos impulsiona a ser tudo de todos e todos como um só. Se não nos vemos porque eu não apareço na igreja, há algo de errado conosco. Que tal consertarmos juntos isso?

E por último, se seu questionamento é “sumido do blog”, aceite minhas sinceras apologias. Não há desculpa para tal, e reconheço que mereço açoites e mais açoites vindo de leitores impenitentes como vocês.

segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Pobre de Mim

Sou como um homem faminto que procura uvas nas parreiras e figos nas figueiras e não encontra nada, pois todos os frutos maduros já foram colhidos.

No país inteiro não há uma só pessoa honesta, ninguém que obedeça a Deus. Todos estão procurando matar os outros, e cada um procura colocar seu parente na cadeia. Todos estão prontos para fazer o mal: autoridades exigem propina e juízes cobram presentes para torcer a justiça.

Gente poderosa confere como vai fazer para satisfazer seus desejos malignos, muita gente planeja fazer maldade. As pessoas mais honestas não passam de espinheiros. Creio que um dia Deus irá exercer sua justiça, como os profetas já anunciaram antes.

Não acreditem nos vizinhos e amigos, e tenham até mesmo cuidado ao que se diz a sua mulher. Pois hoje em dia os filhos desprezam os pais, as filhas desobedecem a suas mães, as noras brigam com as sogras, sendo que os piores inimigos são sempre parentes.

Eu, porém, ponho minha esperança em Deus, confiando firmemente que ele me salvará. O meu Deus me atenderá!

Miquéias 7 : 1 – 7

sábado, 3 de outubro de 2009

Não Sou Merecedor

Acabo de ler sobre um ex-militar que foi perseguido na época da ditadura. Seus ideais eram de justiça e igualdade, e desta forma, ele não se enquadrou ao sistema e acabou perdendo sua liberdade.

Na ditadura sofreu também o Frei Beto. Numa jogada gatuna, tentaram transformar ele num prisioneiro comum ao invés de político, para humilha-lo ainda mais. Em protesto, Beto deixou de comer, chegando a aproximar-se da morte em alguns dias. Sua família retrucou dizendo para ele não jogar fora a vida, dom precioso dado por Deus. Ele replicou dizendo que o dom mais precioso era a sua dignidade.


Ando pensando nisso dias e dias, cambaleando feito um cego em ruas abarrotadas. Percebo que não sou digno da benção citada por Jesus: bem-aventurados aqueles que são perseguidos por causa da justiça. Indo mais longe, ainda não sou merecedor da bem-aventurança de ser considerado alguém com sede e fome de justiça.

Não posso apropriar-me do sermão da montanha. As cenas de violência e notícias da sub-condição humana apenas me deixam triste. Os relatos sobre crianças violentadas e mortas, bem como a rede maldita da pedofilia apenas me revolta. Gente sendo comercializada como escravo no Brasil ou idosos padecendo nos corredores de hospitais apenas me sensibilizam. Mas, ainda não fui à luta, não dei a cara pra bater, não manifestei a toda gente minha sede e fome de justiça.

Não fui a passeatas, nem manifestações. Não permaneci um incômodo ao sistema, pelo contrário, acomodei-me. Errei ao não dar ouvido a um missionário que afirmou que nenhum sistema religioso suporta a pressão do capital. Meus amigos são capitalistas, mesquinhos feitos sanguessugas. São todos gente boa, amados e queridos, mas ninguém tem feito coisa alguma contra o sistema. E eu tenho sido pior deles.

Minha geração refestelou-se em dívidas e em sonhos de consumo. Fizeram templos bonitos e ao mesmo deixaram crianças morrerem de fome. Abandonaram comunhão por trabalho e dinheiro, deixaram o companheirismo por empresas e carros importados. Criaram igrejas que mais parecem caixinhas de promessas. Que geração leviana!

Ainda não me vejo merecedor que qualquer galardão dos mártires. Sou como Marcelo Camelo, que ao receber o prêmio de melhor composição afirmou: “como posso receber este prêmio numa categoria onde também está Chico Buarque?”. Não posso dizer que sou bem-aventurado se os profetas cuidaram dos pobres e das viúvas enquanto eu preguei um evangelho chinfrim temperado com coisas nada humanizadas.

Por anos eu disse que a salvação de Jesus mitigava o sofrimento deste mundo – ledo engano! Desencarnei-me, fiz-me um completo carola em tempos enfadonhos onde meus vizinhos passavam fome e frio. Desumanizei-me ao afirmar que as pessoas padeciam por não se comprometerem com Cristo. Só fui perceber que estava errado quando eu mesmo passei a sofrer dia após dia, sendo eu um completo pelego e consumidor da igreja.

Nunca fui perseguido por causa da justiça. Não possuo tal bem-aventurança.

Tiago 1:27 – Para Deus Pai, a religião pura e verdadeira é ajudar os órfãos e as viúvas nas suas aflições e não se corromper com as coisas deste mundo.


terça-feira, 15 de setembro de 2009

Sem Privilégios

Em tempos de epidemia da gripe suína, a freqüência dos cultos nas igrejas ficou comprometida. Algumas comunidades dispensaram todas as crianças dos encontros dominicais. Em outras, até mesmo o abraço ou aperto de mão fraterno foi suspenso por um pequeno período de tempo. Houve protestos de pessoas cheias de boas intenções, as quais afirmavam que Deus protegeria seus filhos de todo o mal.

Creio no livramento, mas não o coloco como privilégio apenas de crentes. Não posso aceitar que Deus faria acepção de pessoas dando graça apenas a alguns. Existem muitos exemplos de pessoas totalmente comprometidas com o Senhor, e que ainda sim, padeceram de enfermidades ou de uma espécie de acidente.

Meu coração se entristece ao perceber que milhões de crianças padecem de doenças no cinturão mais pobre do globo. Não seriam elas merecedoras de livramento da mesma forma que eu? Não aceito a explicação que a miséria e a morte que assola a África são fruto de sua idolatria e ocultismo. Que culpa teria uma criança pelo erro de outro alguém?

Eu ando rejeitando todo e qualquer privilégio que houver, pois não me conformo em receber algo enquanto gente morre de fome nas proximidades. Espero receber na exata medida do que estou fazendo. Que seja tudo fruto do meu suor e não de benefício algum. Que seja fruto de joelhos e cotovelos calejados, não de isenção de percalços.

Forço a mente e o coração num caminho de simplicidade. Não faço mais orações pedindo emprego. Não intercedo mais para que amigos conquistem vagas em concursos. Não peço a Deus mais nada, a não ser que me lembre de minhas responsabilidades. Se eu desejo melhor salário, esforço-me para assim o merecer. Se um irmão precisa de emprego, que ele levante cedo e vá a luta.

Meu desejo é viver a vida de forma equalizada a todos os demais, sem qualquer privilégio.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

O Pulso Ainda Pulsa

Que programação normal, que nada!

Quando eu pensei que voltaria a escrever no blog, após a recuperação de uma dor incômoda no cóccix [esse é o jeito certo de escrever], veio uma tendinite na mão esquerda devido a um esforço demasiado.

Imobilizei o pulso com um tensor e apliquei periodicamente antiflamatório de uso tópico, mas cheguei a perder o movimento do polegar devido a intensa dor que estava senti. Para realizar o tratamento, o blog recebeu mais uma pausa de uma semana.

Enfim, as idéias continuam fervilhando em minha mente. Há dois assuntos que pretendo desenvolver e transformar em texto – isso deve acontecer até o próximo final de semana. Adquiri dois CDs novos: John Mayer (Heavier Things) e George Harrison (Let it Roll – coletânea). Comprei também mais três livros dos quais quero destacar apenas um: “Eu creio, mas tenho dúvida” do Ricardo Gondim. Estou satisfeitíssimo com minhas aquisições.

Minha família continua maravilhosa – duvido que algo menor que isso ela venha ser um dia. A caçulinha já está dando seus primeiros passos. A Nicolle, com seus 11 meses de vida, anda cambaleando feito gente embriagada. A Michelle vem demonstrando uma inteligência incrível. Inventa brincadeiras e cantarola as canções dos DVDs infantis que possui. Passo quase meu final de semana inteiro com elas. Tem sido a melhor terapia do mundo.

Meu sobrepeso está com 7 quilos a menos. A medicação para a tireóide que estou tomando tem efeito positivo e o resultado muito me agrada. Continuo com uma dieta básica, que fujo de vez em quando, mas continuo em frente.

O blog já possui alguns leitores assíduos, que os estou classificando como "leitores impenitentes", inspirado no filme Indiana Jones e a Última Cruzada. Deixo um abraço a todos e reafirmo que não quero seguidores, fama ou status de guru. O blog é mais uma coletânea de idéias de um cara que não é exemplo algum... portanto, utilizemos este espaço aqui para trocar experiências ou debater ideais. Não é necessário concordar comigo - procurarei fazer o mesmo por vocês.

Acho que tudo está O.K., com algumas raras exceções. Mas, não prometerei voltar com a programação normal. Da outra vez não consegui cumprir.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Opção Solitária

O sentimento de angústia sempre foi uma espécie de companheiro. Escolhi inúmeras vezes a solidão em vez dos amigos para ter tempo para pensar na minha vida – em especial no futuro, procurando decifrar o porquê daquele aperto no peito. Fui taxado como mal-humorado muitas de vezes por essa opção solitária. Sempre gostei de ficar sozinho, sem ter nada para fazer.

Entendo que a vida é como um corredor de paredes ásperas que se estreitam com o passar dos anos. Tem dias que pareço estar gritando dentro de uma bolha e que ninguém consegue ouvir. Meu coração se corrói quando minha opinião não é considerada ou quando sou classificado como jovem demais para ser levado em conta.

Nunca dei crédito as opiniões que colocavam minha angústia com problema espiritual. Sempre me senti próximo de Deus e fiz valer a citação bíblica que nada podia me separar do seu amor. Se nem anjos ou principados podiam criar distância entre mim e meu Senhor, alguma angústia pessoal poderia?

Eu não faço defesa alguma para o sofrimento. Ao contrário, gostaria que ninguém sofresse. Gostaria que crianças não sofressem com o divórcio egoísta dos pais, gostaria que famílias não passassem fome pela má distribuição de renda, que jovens não perdessem o sentido da vida ao se viciarem com drogas.

Acontece que tenho momentos estranhos. Fico quieto, pensativo, muito diferente do meu padrão. Esforço-me constantemente para não deixar que alguma coisa engaiole a alegria, pois sei que algumas tristezas são destrutivas. Meu silêncio é apenas para dar um sentido a minha angústia. Rebusco pensamentos lógicos, converso com Deus, procuro sabedoria, dou braçadas no mar da solidão.

Quando encontro algum sentido, encho o peito de emoção. Creio que pagamos um preço para crescer em humanidade, pois a sabedoria custa caro. O mesquinho não sofre. O idiota não questiona. O ingênuo não se aflige. Mas eu percebo que evoluo crise após crise, angústia após angústia. Renovo-me após alguns momentos de silêncio.


sexta-feira, 4 de setembro de 2009

O Blog Pagou o Preço

Andei meio afastado do blog. O motivo foi que meu sobrepeso com minha rotina diária, provocaram uma espécie de inflamação. Segue a explicação detalhada.

Ás 06h40min eu tomo a condução da empresa que me leva ao trabalho. Vou sentado. Quando chego à minha sala, passo cerca de 90% do meu tempo sentado em frente ao computador. À noite vou para a faculdade e passo mais 4 horas assistindo aula. Sentado, claro. No final do dia, lá pelas tantas, eu dedico mais 1 horinha para escrever e publicar algo no blog. O resultado de tudo isso é que venho sentindo uma dor muito incômoda na coluna, especificamente no cóxis.

No trabalho, ajustei as regulagens da minha cadeira de uma forma mais anatômica e aconselhável ao meu peso. Na faculdade, procurei assentar nas cadeiras com assento mais fofinho, com maior volume de espuma. Nas duas situações, não passo mais do que 60 minutos sentado. Procuro dar uma caminhada de 10 minutos (uma ida no cafezinho ou ao banheiro) entre um período e outro.

Em casa a coisa ficou complicada. A cadeira do computador não possui muitas opções [entenda-se apenas uma] de regulagem e o assento não é muito servido [entenda-se coisa velha] em espuma. Como precisava dar um alívio a minha bunda, abandonei o blog por quase duas semanas.

Acredito que hoje já estou 50% melhor. Acredito também que devido à situação de estresse no trabalho nas últimas semanas, passei muito tempo numa postura inadequada que ocasionou tal desconforto.

Mantive a dieta, continuei tomando medicações para a tireóide e com certeza andei perdendo peso. Mas, a dor na bunda precisava de uma tratativa mais pujante: evitar ficar tanto tempo sentado. Como não tenho como abandonar o trabalho ou a faculdade: o blog pagou o preço.

Aviso a todos os leitores assíduos do blog que a programação voltará ao normal a partir de hoje. Antes vou dar uma caminhada. Volto em 10 minutos.

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Graça

Quando tinha 8 anos, quebrei o óculos da professora que estava em cima da sua mesa, por estar fazendo bagunça. Aos 13, levei suspensão por ter faltado com o respeito com a professora, cutucando-a por trás com uma caneta esferográfica. Mais de uma vez afanei brinquedos de colegas, tendo que devolvê-los após horas de bronca e surra.

Falsifiquei a assinatura da minha mãe, surrupiei dinheiro para jogar fliperama, quebrei a janela do vizinho atirando uma pedra propositadamente. Subi no telhado da casa da minha avó, usando os galhos de uma goiabeira que crescera mais que o normal, causando desespero aos adultos que assistiam tudo lá de baixo.

Colei nas provas do ginásio e do segundo grau. Escalavrei-me no asfalto mais 100 vezes caindo de bicicleta – uma vez quase fui atropelado pelo caminhão de lixo. Troquei socos com meu irmão, com meus primos, com meus vizinhos. Xinguei adultos e idosos. Fui considerado rebelde mais vezes do que consigo me lembrar.

Aos 12 anos, troquei beijos e abraços escondidos com a vizinha. Aos 18 experimentei cigarro para fazer charme a mesma vizinha. Dirigi meses a fio sem ter carteira de motorista. Bati na traseira de um carro e saí correndo do local do acidente uma vez. Apresentei atestado médico falso para justificar ausência na empresa onde fazia estágio.

Muitas destas atitudes foram sucedidas por enorme sentimento de culpa. Experimentei a sensação do peso na consciência. Morria de medo quando pensava na volta de Jesus. Como poderia eu ser salvo se faço todos estas coisas? Não devia eu ser santo?

A resposta destas indagações talvez eu não consiga oferecer. Há algo de constrangedor na graça da salvação. Há algo humanamente incompreensível no amor de Deus. Eu, pecador miserável, não pude escapar das garras da graça quando a encontrei.


sábado, 22 de agosto de 2009

Maioria

No texto anterior, um holofote foi aceso sobre universo masculino: os homens foram mais privilegiados com resultado obtido no desenvolvimento sócio-cultural de anos e anos. Ainda que o texto escrito não tenha nos seus parágrafos uma leitura social em detrimento a mulher, reconheço que foi jogado confete apenas sobre o homem. Desta forma, aproveito a lacuna para compensar tal situação.

Estatisticamente, as mulheres já estão em maioria dentro das igrejas. Há poucos dias, li um artigo sobre a igreja anglicana, que ordenou pela primeira vez na história, mais mulheres que homens na Inglaterra. Apesar de haver cada vez mais mulheres no sacerdócio, o clero feminino quase não teve impacto devido, principalmente, que a maioria das mulheres trabalha voluntariamente.

Mulheres sofrem mais com a causa alheia por serem mais sensíveis. São intercessoras penitentes, possuidoras de uma fé muito forte. Repartem com mais dedicação o que possuem, multiplicam talentos e oportunidades. Nas ações sociais são mais dedicadas, árduas trabalhadoras. Nos campos missionários, são mais apaixonadas pelas culturas distintas. Nas reuniões de oração, são indispensáveis.

Participei de mais cultos missionários liderados por mulheres do que por homens. Percebi mais doação de dinheiro vinda de mãos femininas do que masculinas. A continuidade de trabalhos como EBD, creches, escolas, assistência social, enfermarias, se deve mais a elas do que a eles.

Se no passado as mulheres foram resignadas ao lar, o resultado necessariamente não foi ruim: a elas foi dada a graça de transmitir o conhecimento a próxima geração. Compromissadas com o lar, a mulher desenvolveu melhor a capacidade de relacionar-se de forma mais profunda, criando um núcleo familiar forte.

As mulheres especializaram-se na esfera de relacionamentos íntimos: expressam mais claramente os sentimentos, distribuem melhor os recursos, tornaram-se cooperativas. É devido a estes fatores, causados pela forma de como a cultura se desenvolveu, que as mulheres tornaram-se indispensáveis nas atividades da igreja. Talvez a igreja fosse totalmente diferente do que é hoje se não houvesse tantas mulheres em pujante participação. Arrisco a pensar que a igreja seria totalmente desumana, se não fosse por elas.

As mulheres já são maioria. Com o passar dos anos, a igreja será cada vez mais feminina.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Seja Homem!

Você já percebeu que uma pessoa adulta do sexo feminino recebe o devido respeito como mulher enquanto o mesmo não ocorre aos homens na maioria das culturas do planeta?

Creio que no senso comum, a honra do título “homem” não é concedida até que o indivíduo do sexo masculino demonstre o seu valor. Trata-se de uma condição de se fazer perceptível, dentro de uma espécie de critério. A sociedade espera dos homens que estes sejam suficientemente provedores de seu próprio sustento – se outra pessoa o faz, este ainda não chegou a ser verdadeiramente homem. Numa segunda expectativa, superior a anterior, o homem deve ter capacidade de gerar determinado provento adicional, sendo assim, capaz de beneficiar outros, como esposa, filhos ou outros dependentes.

Após alguns minutos de consulta ao oráculo Google, encontrei dois artigos, elaborados por estudiosos, que enfatizavam a vertente da sociedade atual: todo homem de verdade deve produzir mais do que consome. Em outras palavras, homem que é homem acumula riqueza.

É preciso lembrar que a cultura explora o homem e a mulher de modos diferentes, e por isso não creio que seja mais difícil ser um ou outro. Uma dessas maneiras exploratórias é exigir que o homem mostre-se sempre merecedor de respeito, provendo sustento para si mesmo e para outros. As mulheres não têm de enfrentar este tipo de desafio, e talvez seja por isso que a maioria dos casos de desalento e depressão no mercado de trabalho é de homens.

Nos tempos mais remotos, as sociedades consideradas evoluídas eram aquelas que possuíam o maior número de integrantes. A reprodução garantia a sobrevivência da espécie numa forma mais perceptível do que é hoje. Neste prisma, a necessidade social era que os úteros fossem maioria sobre os pênis, afinal pouquíssimos homens poderiam fertilizar um bom número de mulheres, garantindo o crescimento da tribo de forma suficiente – o contrário não seria possível. Portanto, as chances eram mais favoráveis para as mulheres, pois bastava a elas serem amáveis e esperar por um homem disposto a fazer sexo.

Como o sucesso estava sendo medido pelo número de herdeiros, para os homens a disputa tornou-se grande na esfera social. Uma mulher já fecundada era como uma vaga preenchida no balcão de empregos, e com isso forçava o homem a lançar-se ao mar, na busca pela conquista de novas terras e novas mulheres. Para vencer, o homem precisou ser inovador, criativo, explorador e com real capacidade de assumir riscos.

Neste ponto, pode-se concluir que descendemos do tipo de homens que fizeram uma viagem arriscada e que voltaram ricos. Somos filhos de mulheres amáveis que se relacionaram com homens que assumiram riscos. Creio que é nesse exato ponto onde se percebe a razão que a sociedade dedica aos homens um reconhecimento maior do que para as mulheres.

Talvez a natureza tenha adequado as mulheres para serem mais amáveis, enquanto os homens foram inclinados para correrem atrás da grandeza. Essa tendência masculina posicionou o homem nas duas extremidades sociais: os homens estão em maior número no governo, nas gerências, nos presídios, nas universidades, no tráfico, nas drogas, na promiscuidade, nos doutorados, no crime organizado e assim por diante. Quem é morto nas guerras? Quem possui profissões com as atividades mais insalubres? Quem são os sem-teto? Quem está no comando? Basicamente, homens.

Eis porque da religião, da literatura, da arte, da ciência, da ação militar, do mercado, da organização política e da medicina terem emergido da esfera masculina. Não é uma questão de habilidade prática muito menos uma conspiração masculina contra as mulheres, mas sim ao fato da cultura ter se desenvolvido essencialmente no modo de relacionamento social, o qual favoreceu os homens.

Nada de Escândalo

Acho que depois que meu caráter e minha fé amadureceram, pouquíssimas coisas (talvez nenhuma) conseguiram causar em mim qualquer tipo de escândalo. Não me espanto mais quando alguém anuncia seu divórcio, quando a filha de outrem engravida antes do casamento ou quando um velho conhecido abandona a igreja.

Numa linha de raciocínio mais clara, afirmo que o pecado não move mais em mim qualquer sentimento relacionado com o escândalo. Em primeira mão, não me espanto mais com o tropeço de alguém (qualquer que seja) evitando assim, não sentir comichão na língua para contar a outra pessoa. Segundo, porque encaro pecado como natureza de apenas um padrão de classificação, ou seja, contar uma mentirinha ou cometer adultério é a mesma coisa – ainda que tenham conseqüências bem distintas. Obviamente, não me concentro no que pode acontecer, bastando a cada dia o seu mal.

Nesta segunda via de pensamento, fica o meu descontentamento e protesto contra as medidas disciplinares que a liderança eclesiástica vem imprimindo. Digo isso porque é sempre exposto ao ridículo e aos açoites aquele pecador que engravidou a namorada, porém o mentiroso e sonegador de impostos recebem, quando muito, o esforço da fofoca e do puxão de orelha. Assim, a única forma que encontro para reagir contra esse grande vacilo dos líderes, é não dando a mínima ao erro que qualquer um pode cometer.

Não acredito muito na história de “fiquei escandalizado”. Quando ouço essa frase, normalmente percebo que é mais um “não gostei disso” ou “não concordo” do qualquer outra coisa. É uma grande cilada, mas apenas para quem esparrama por aí seu pseudo-escândalo.

Já estive numa roda onde o baseado estava aceso, dei carona pra quem não conseguia andar devido ao consumo de álcool, joguei truco em mesa de boteco, participei de churrascos em companhia de ateus e drogados, emprestei dinheiro para vagabundos e lascivos, dancei a noite inteira na festa de aniversário de um amigo que estava lotada de gays, travestis e lésbicas. Não me tornei impuro, não fui influenciado e não cometi nada que desabonasse minha conduta, ainda que esta não seja exemplar. Ao contrário, amei e fui amado por “este tipo gente”, enquanto me mantinha um carola.

Fico estarrecido quando ouço sobre a desnutrição dos pequeninos no sertão, perco o sono quando fico sabendo que um conhecido está com uma doença terminal, choro de raiva com os relatos estatísticos da guerra do Iraque, desespero-me com as notícias da violência doméstica, embrulha-me o estômago saber das trapaças no congresso. Mas, de uns tempos pra cá, nada mais me acontece quando sei de um vacilo espiritual de alguém.

Decidi não dar mais ibope ao pecado. Decidi não ser platéia curiosa do acusador. Decidi não ser o catalisador do peso da consciência de ninguém. Esforço-me apenas para abraçar aquele que reconhece seu erro, que pede socorro, que necessita de ajuda. Que seja eu, um ponto de apoio e intercessão em favor dos pecadores. Já fui acudido por eles um dia.

Que atirem a primeira pedra – estou pronto para cuidar da ferida, seja minha ou de outro alguém.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Encruzilhada

Se estive analisando esses trinta anos de vida que usufruí neste planeta, é porque estou percebendo os rebentos das minhas atitudes. Algumas lanças atiradas para o alto estão volvendo de ponta para baixo, forçando-me no reflexo de esquivar momento após outro.

Percebo que este sobrepeso e sedentarismo cultivados na última década, renderam-me um saldo negativo e, obviamente, não poderia ser diferente do que me é apresentado hoje. Começo a experimentar quase que cientificamente coisas como pimelose, tendinite, apnéia, dislipidemia e triglicerídeo – palavras rebuscadas, mas cujo significado é simples como um susto.

Aprendi na escola que a glicose é uma das principais fontes de energia do organismo, mas quando em excesso, pode trazer várias complicações à saúde. Tenho visto nos noticiários que existem mais 300 milhões de obesos no mundo, um terço deles estão nos países desenvolvidos. A obesidade é vista cada vez mais como um crescente problema de saúde pública, pois predispõe o organismo a uma série de doenças, em particular doença cardiovascular, diabetes e osteoartrite.

Outro assunto que circula no meu cotidiano e nas manchetes dos jornais é a questão do estresse. Ele pode iniciar-se por uma demasiada ansiedade e/ou por uma mudança brusca no estilo de vida. Ambas as situações levam a pessoa a sentir um determinado tipo de angústia. No prolongamento dos sintomas de estresse, além dos sentimentos de evasão, os mecanismos de defesa passam a não responder de maneira eficaz, aumentando assim a possibilidade de vir a ocorrer doenças.

Encontro-me numa encruzilhada. O caminho que escolhi levou-me a um ponto sem retorno, tendo exatamente três opções a minha frente: sigo em frente e continuo como se nada tivesse acontecido, dobro para a direita conservadora e inicio um regime alimentar combinado com algum medicamento, ou viro à esquerda revolucionária e entro no processo de preparação da cirurgia bariátrica. Em minha mente só há uma mensagem: não siga em frente!

Tenho medo da revolução. Decepcionei-me com Che Guevara quando este afirmou que acreditava na luta armada. Esta opção esquerda, ainda que seja eu um simpatizante, não me transmite paz. E não se deve esperar outra postura de um sedentário. Optar pelo caminho que faça menos agressão ao corpo é um pensamento de gordo.

A consulta médica marcada para esta terça-feira passada, revelou minha situação de saúde. Tenho o resultado dos exames nas mãos e uma tabela que indicam que meus números não estão bons. Tenho quase 30 anos, mais de 120 quilos, uma esposa e duas filhas. Tenho que fazer algo melhor para meu corpo.



A cabeça está em ordem, obrigado.

domingo, 16 de agosto de 2009

Discípulo

Escrevi anteriormente sobre exemplos: ícones que brotaram no deserto da humanidade. Fiquei pensando numa frase de Gandhi: se os cristãos realmente vivessem de acordo com os ensinamentos de Cristo, como descritos na Bíblia, toda Índia seria cristã hoje. Em seguida lembrei que basta o discípulo ser com o seu mestre.

Este rebuliço de frases e idéias fizeram-me pensar um pouco sobre como é difícil ser um seguidor de Jesus. Como ser um imitador do maior de todos os exemplos? Como imitar alguém inimitável? Como ser discípulo de Cristo sem ser ofuscado por sua glória?

Quanto mais admirável o exemplo, mais difícil torna-se imitá-lo. Isso porque, paradoxalmente, quanto mais brilho o exemplo possuir, maior será a sombra que seu discípulo fará projeção. Quanto mais integridade o exemplo demonstrar, mais iniqüidade o discípulo apresentará. Isso se dá inevitavelmente pela proximidade junto ao mestre. Mas, há um pequeno detalhe e é esse o meu gancho para este texto.

A obra de Jesus estava apenas iniciada e cabia a seus discípulos continuar suas maravilhas aqui na terra. E sendo assim, deixou apenas uma recomendação: que não se dispersassem até que o espírito fosse derramado. E assim eles fizeram, formaram uma união nunca antes experimentada e essa foi o primeiro passo rumo a solução do dilema: como imitar Jesus.

Com a aproximação, surgiu a primeira comunidade cristã. Neste ajuntamento, eles tiveram que visualizar o segundo passo do seguidor de Jesus. Tiveram que aprender a ceder, acolher, aceitar, dividir e muito mais que tudo isso junto, a amar incondicionalmente. Jesus, na maioria das vezes concedia importância muito secundária a seus milagres, preferia evitá-los ou mantê-los em segredo. O enfoque do messias era uma espiritualidade desenvolvida na esfera do toque, na proximidade, na amizade.

O segundo passo que os apostos tomaram, foi deixar de considerar que a faceta mais digna de admiração do ministério de Jesus foram seus milagres e não seu caráter, seu ensino, seu infinito amor e desconcertante perdão. Assim, estando eles imbuídos pelo espírito e totalmente transtornados pelo exemplo demonstrado passo a passo por Jesus, encontraram a solução.

Ser um verdadeiro seguidor de Jesus era desejar o que ele desejou: coisa alguma. Cristo esteve presente na terra e esteve unido com seu povo, falou na língua deles, dormiu na cama dos cobradores de impostos, sentou à mesa com pecadores e por assim ser, passou uma mensagem de inclusão a seus discípulos. Porém, ao manifestar seus milagres, ressaltava “não conte isso a ninguém”.

Cristo não procurou fama, não buscou notoriedade. É por isso que há mais registros dele falando “vá para sua casa” do que “venha me seguir”. Seu ministério foi desenvolvido na proximidade, fazendo uma inclusão de todos à graça do Pai por meio de seu sangue.

Aquele que abraça a todos sem distinção, que transmite tranqüilidade e perdão a qualquer um, que abençoa e que em nenhum momento deixa isso transparecer, este é o verdadeiro seguidor de Jesus. Aquele que reconhece como maior valor o abraço do que um milagre sobrenatural, este é o verdadeiro seguidor de Jesus.

sábado, 15 de agosto de 2009

A Voz dos Exemplos

Exemplos são raros, mas são suficientes. Poucas pessoas deixaram marcas numa geração, num país ou num movimento. Ainda que poucos foram os que tiveram privilégio de estar próximo de um ícone, o mundo inteiro recebeu os traços da radiação de grandes exemplos, devido sua determinação.

Falo de gente como Madre Tereza, que ao perceber a condição de miséria das crianças, mulheres e idosos na Índia, tornou-se missionária e enfermeira para melhorar condição destes. Idealistas como Martin Luther King, que lutou pelos direitos civis de negros e mulheres através da não-violência e de amor para com o próximo. Líderes como Gandhi, que unificou hindus e muçulmanos na luta pela independência de seu país, estando disposto até em morar nas ruas sujas com os pobres se necessário fosse. Corajosos como Nelson Mandela, que não aceitou o regime apartheid de segregação racial, condicionando-se como prisioneiro pela recusa em incentivar a luta armada.

Muito mais que o brilho do verniz destes exemplos, é a abdicação das condições normais que possuem em prol da conquista de seu ideal. Dedicação extrema a algo que não é interesse particular, mas sim de bem comum a todos. Casos impressionantes como o de Thich Quang Duc, que chegou a abrir mão de sua própria vida para chamar a atenção do mundo para os abusos feitos contra seu povo, ecoam geração após geração. Histórias como de Simone Weil, que deixou de comer protestando contra as condições em que eram mantidos os prisioneiros de guerra na França ocupada, vindo a falecer em sua greve de fome.

Creio que exemplos são poucos porque determinação para o bem é elemento raro na natureza humano. Somos inclinados e doutrinados na individualidade. Dificilmente conseguimos pensar em algo que seja comum a todos, dificilmente conseguimos entender que o lucro está em não ter lucro algum.

Abram os ouvidos, pois a voz dos exemplos ainda fala bem alto.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Trinta

Aos poucos envelheço, mas não me considero velho e muito menos antiquado. Relaciono-me bem com os que são juvenis hoje, conheço sua linguagem, sua música, sua bandeira. Envelheço e sou ainda tão jovem. Não tenho idade para deixar de existir, mas tenho para assumir as conseqüências de meus atos. Tornei-me um adulto.

Casei com a primeira mulher que disse que me amava. Conheci-a aos 16, a pedi em namoro aos 20, em casamento aos 26 e hoje aos 30 eu só lhe peço que cuide de mim. Ao unir-me com ela, aprendi a dividir coisas como tempo, dinheiro, espaço e liberdade. Passei a compreender, ainda que parcialmente, costumes e dificuldades estranhos. Comecei a investir qualidade de tempo para cuidar de corpos e corações. Ao unir-me com minha esposa passei a ser responsável por uma família: cresci como ser humano.

O casamento, além de me proporcionar condições de crescimento social e espiritual, presenteou-me com duas filhas. Foi através da experiência da paternidade que entendi o quanto devemos amar incondicionalmente uns aos outros. Minhas filhas retribuem com sorrisos e beijos o suor do meu rosto. Se eu agisse conforme o pensamento vigente deste mundo, elas estariam em grande dívida comigo, mas não é assim que as coisas devem ser. Eu gasto tempo e dinheiro, abro mão de planos e desejos de consumo, invisto em coisas que não são de meu interesse, simplesmente pela necessidade delas. E me satisfaço com isso. Não espero receber nada em troca. Quem me dera que o planeta estivesse cheio de pessoas agindo em prol da subsistência das outras sem esperar retorno.

Envelheço dia a dia. Os cabelos já se apresentam em menor número, as marcas e sulcos no rosto já são um pouco mais indiscretas e os calcanhares se enrijecem feito pedra-pome. Ainda que sinais como estes apareçam no espelho, ainda não tornei um velho. Creio estar iniciando a travessia da ponte da meia-idade, sou novo demais para afirmar vivência e maturidade, sou velho demais para relaxar e não arregaçar as mangas.

Quando criança era totalmente dependente. Até mesmo para poder me alimentar dependia das mãos do meu pai e do cuidado de minha mãe. Com o passar dos anos, comecei a dividir timidamente as despesas com minha mãe, mas ainda não era responsável por nada. Hoje, após ter recebido sustento por mais de 20 anos, assumi o papel do supridor, de quem atende as necessidades de um lar.

Balancei as flâmulas da mocidade deixando para traz as pegadas da infância, troquei as bermudas por calças jeans, deixei o cabelo e a barba crescer, passei a usar título de eleitor, shampoo anticaspa e gravata, mudei o turno escolar, substituí a teimosia infante por palavrões.

Em 30 anos de vida experimentei crescimento físico, emocional e espiritual. Não estou nem velho nem novo. Passei para a fase que só existe para delimitar os grupos de idosos e jovens.

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Fama: consumismo maldito

Depois de meses de recuperação de um tratamento intensivo contra a evolução de um tumor, ocorreu um acidente de trânsito que o deixaram impossibilitado de trabalhar. Estes episódios fadaram Paul Potts a acumular uma dívida suntuosa e a encarar posteriormente o trabalho de vendedor de celulares para poder se manter. Manteve em segredo sua inscrição no “Britain’s Got Talent”, programa do ano de 2007 em que saiu como o grande vencedor, aclamado por milhões, revelado como grande estrela. Paul Potts tornou-se celebridade.

Com o passar dos dias, Potts adquiriu involuntariamente o fungo mortal da fama. A celebridade traz sempre este verme maldito em seu verniz: quem a adquire leva em conjunto a fama e somente uma dose de integridade e desapego ao material pode manter alguém praticamente ileso de seus efeitos nocivos.

A fama é como um câncer que consome os tecidos da humanidade; transforma o ídolo em alimento e o público em estômagos insaciáveis. Gente como Michael Jackson ou os Beatles perderam muito mais que a vida pública. Perderam o direito de opinar sobre assuntos delicados, perderam a oportunidade de errar, perderam a simplicidade de apenas não fazer nada.

O público consome tudo. Se o ídolo decide não viajar mais, é questionado por tal opção. Se o ídolo emagrece repentinamente, é indagado sobre substâncias ou viroses que por ventura venham a correr em suas veias. Se o ídolo possui excentricidades, recebe holofotes e colunas dedicadas a ressaltar suas nuances.

Nas primeiras transmissões do programa, Paul Potts não demonstrou confiança e não apresentou boa aparência. Potts chamou a atenção por sua exímia apresentação e extensão vocal. Seu talento pôde aflorar sozinho na primeira audição porque não havia o que dividisse espaço com ele como beleza, moda, carisma e muito menos fama. Competiu etapa por etapa e venceu o programa cantado ópera, língua que não é de domínio geral, não é normalmente apreciada por quem assiste concurso de calouro.

É apenas no período anterior a ascensão repentina de Potts, que o público realmente dedicou ao seu consumível alguma espécie de carinho. O público, ao ver um homem franzino, feio, não confiante e desengonçado, identifica-se imediatamente. Potts tornou-se momentaneamente um espelho, suas incompetências representavam uma multidão aglutinada em sofás e cadeiras posicionados do outro lado da tela do televisor.

Incorporado o tempero da fama, homens transformam-se em ídolos e fãs, e posteriormente em ração e animal respectivamente. Qualquer imagem, qualquer nota, qualquer informação, ainda que de fontes mentirosas, servem de alimento ao público-parasita.

Se Potts retornou a vender celulares ou está em turnê mundial, ainda não percebi nada nos canais de informação. Forço-me apenas saber como está sua vida. Não quero incorporar o perfil do público-parasita, não quero descriminar as escolhas ou os tropeços de alguém exatamente igual a mim. Já me é suficiente conhecer que um homem realizou maravilhas sem qualquer ajuda da fama.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

O Deus que Creio

Deus está muito acima das idéias e imagens que possamos ter sobre ele.

Eu acredito em Deus. Porém, não acredito que o futuro é imutável, que tudo o que aconteceu e acontecerá estão devidamente cadastrados num banco de dados divinos. Creio que nosso livre arbítrio em associação com a intervenção divina pode construir um futuro diferente.

Eu acredito em Deus, mas não acredito que ele opera milagres de forma seletiva, entregando dádivas apenas a quem ora ou quem cumpre mandamentos bíblicos. Se assim fosse, Deus estaria fazendo acepção de pessoas, pois abençoaria uns e amaldiçoaria outros. Se assim fosse, Deus seria o responsável pelo sossego da vida de políticos corruptos e empresários gananciosos, possuidores de contas bancárias rechonchudas. Se assim fosse, Deus estaria negligenciando cuidado aos pequeninos que sofrem abusos nas mãos de homens violentos e as crianças que padecem de fome e sede nas regiões mais pobres do planeta. Se assim fosse, Deus seria alguém muito estranho: atenderia uns e não atenderia outros. Qual seria o critério divino?

Eu acredito em Deus, mas deixei de acreditar que a devoção a ele nos traz uma vida isenta de intempéries. Não consigo engolir que a igreja tenha a função de tornar os dias mais leves através do acesso ao sobrenatural. Não suporto mais aquela a fé de cunho preventivo, aquelas orações feitas para evitar percalços e aquele tipo de gente que afirma que os salvos recebem livramento das adversidades. Não creio num Deus parcial, que se move apenas ao ouvir orações vindas de crentes.

Não acredito que Deus está no controle de tudo, ainda que tenha pleno poder para assim proceder. Não posso acreditar que a vida roubada daquela criança atirada pela janela teve uma permissão divina. Se assim fosse, Deus seria responsável pela falta de bom senso dos pais que decidiram jogá-la de lá. Para mim, Deus não permite furacões e enchentes que matam milhares, balas perdidas que deixam inválidos, crises econômicas que implicam na fome de milhões de famílias. É nossa a responsabilidade pelo trânsito violento, pela política corrupta, pelas doenças sexualmente transmissíveis, pelas síndromes, crises e epidemias. Nós somos os culpados.

Visualizo o meu dia de forma bem tímida, minuto após minuto. Preparo-me para o futuro de maneira simples, exigindo competir sem qualquer privilégio por ser “filho do rei”, aperfeiçoando-me com a medida que posso alcançar. Creio que a benção cai do céu para justos e injustos, e é por isso que não peço a Deus aquilo que ele já está imbuído de me oferecer diariamente.

Acredito num Deus poderoso, que me ama de maneira incondicional assim como ao budista, ao espírita, ao católico, ao hare krishna e aos demais de todos os matizes. Não me coloco em posição de destaque espiritual, nem ao menos me considero mais próximo da graça do que qualquer outro, cristão ou não-cristão.

Deus está muito acima das idéias e imagens que possamos ter sobre ele.
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Espiritualidade à Flor da Pele

Nos últimos tempos, venho percebendo que a maior parte do que é comunicado sobre espiritualidade é sempre algo relacionado às esferas não humanas, a coisas e situações que nada tem conexão com a carne. E não é por menos: cresci ouvindo sobre a luta entre o espírito e a carne, e nesta rotina infectei-me com certa aversão aos impulsos de minha natureza. Os testemunhos que escutei em maioria traziam a associação de espiritualidade com maravilhas, milagres e dons espirituais, confinando assim a amizade, o amor e a compaixão num plano inferior.

O senso comum absorveu a espiritualidade como algo distante da vida normal, gerando confusão entre o desejo de nos aproximarmos de Deus e o estado de sermos conforme nossa natureza. Desta forma, ações foram classificadas em uma espécie de escaninho de entrada e saída: ler a bíblia é espiritual, assoviar não; cantar no coral é espiritual, dançar não; dar o dízimo é espiritual, manter a casa limpa não; jejuar é espiritual, receber um amigo para jantar não; vida devocional de um casal de namorados é espiritual, seu beijo não.

Cristo deixou claro que lidava com corpos e não com espíritos, pois não ignorava os embaraços da carne como doença, fome, dor, decrepitude ou morte. Ele esteve exposto a fome, ao medo, a sede, ao toque, ao beijo, e não recusou tal condição humana. A natureza divina de Jesus estava MANIFESTA NA CARNE e por isso ele exercia sua espiritualidade na esfera do toque, da visão, do tato, da presença, da companhia, do sabor, da voz, dos elementos, dos alimentos, dos abraços.

Jesus não apenas tolerou estar inserido como também não aboliu a carne: ele a redimiu! É pregado exacerbadamente que a espiritualidade é terreno exclusivo da vida devocional, da meditação, do jejum, da leitura, do discurso. Dificilmente é compreendida a espiritualidade num abraço, num beijo, numa declaração de amor, numa caminhada, num pedaço de pão compartilhado, numa flor recebida, num encontro em dia de sol.

Somos constantemente comunicativos sobre a importância de morrer e ressuscitar como Jesus, mas não há comunicação alguma para o passo maravilhoso que Jesus fez em direção a carne para santificá-la.
Vá e pregue o evangelho. Se necessário, use palavras.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Caminho da Fé

Tomando o gancho da pergunta que fiz para mim mesmo, respondida no texto anterior a esse, lembrei-me de uma situação muito interessante onde eu fui questionado se realmente sei onde vou chegar com a minha fé.

Uma pergunta dessas precisa de tempo de maturação para ser respondida, pelo menos para que eu me satisfaça com a resposta que venha oferecer. Forço neste momento a mente e aos vocábulos para equalizar algo que considero uma boa resposta àquela indagação, que pelo menos me satisfaça.

Não sei qual é o caminho da minha fé porque não gasto mais energia para visualizar o futuro. Não faço mais projeções do que poderei angariar com o empenho da minha devoção a Deus. Eu vivo assim porque quero desfrutar o momento: quero desenvolver e experimentar a fé a cada momento. Dedico-me ao hoje e isso me basta.

Não sei qual é o caminho da minha fé porque fito os meus olhos a menos de um palmo de distância, não desejando ver o que vem pela frente. Contento-me em apenas manter os passos firmes, não vacilantes, sempre em frente. Ainda que seja um andar lento e infantil, sinto-me agraciado por Deus, pois percebo que assim aproveito melhor a jornada.

Se não sei qual é o caminho da minha fé é porque sei certamente quais são os caminhos que não quero trilhar. Fujo das linhas que norteiam uma espiritualidade desconectada da vida normal. Desvio os meus pés destes atalhos, onde a vida espiritual é entendida como cantar um hino, mas acolher um mendigo não.

Encaro a espiritualidade pela redenção que Cristo trouxe a carne. O Messias sentiu fome e sede, esteve exposto ao sangue e ao hálito de acusadores, abraçou, sangrou e morreu – ele, sendo Deus, viveu exatamente como eu e você, sem rejeitar a carne. E é por essa razão que minha fé segue a trilha dos sentidos: um abraço diz muito mais que uma oração, uma carona abençoa muito mais que uma imposição de mãos, um beijo alenta muito mais que um momento de intercessão.

Não me preocupo se sou marcha lenta, não estou competindo. Não acredito que a vida devocional seja uma espécie de maratona, tendo Deus no final da linha segurando a faixa para os primeiros colocados. Meu anseio é pelo que pode acontecer agora, pela beleza do momento, por tudo o que pode acontecer numa visita de um amigo ou no abraço carinhoso de minha filha.
Louvo a Deus por cada ação de felicidade.

Sentido Funcional

Fiz uma pergunta a mim mesmo: onde quero chegar com este blog? A resposta veio quase que de maneira imediata. Não quero chegar a lugar nenhum. Não quero ganhar nada, nem mesmo reconhecimento. Não quero ser levado em conta, não quero seguidores, não quero notoriedade, não quero fama. Escrevo por duas razões simples e é por elas serem assim deste jeito que continuo nesta lida.

A primeira razão que invisto tempo para escrever é porque sinto prazer nisto. Sinto-me bem quando consigo capturar palavras, encaixando-as umas as outras para que assim expressem minhas idéias. Alivio o peso da minha ansiedade em ser ouvido quando consigo finalizar um texto. A segunda razão é mais simples ainda: dedico-me neste blog porque quero que as pessoas leiam o que escrevo.

Em outras palavras, o objetivo do meu investimento neste endereço eletrônico é nada mais do que a única coisa disponível para se fazer aqui: eu escrevo e alguém lê. Algumas variantes podem ser acrescentadas como a possibilidade de inserir comentários, recurso disponível nesta página, mas estes são apenas cosméticos ao verdadeiro sentido funcional do blog.
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Não posso negar que gostaria muito de ver algumas participações como a inauguração dos comentários. Em geral, o que deposito aqui são abstrações sobre minhas experiências vividas, e isto tudo seria muito mais interessante com as interações possíveis enviadas pelo canal dos comentários.

Enfim, senhoras e senhores, se estou aqui escrevendo algo é antes de qualquer coisa pelo prazer que tenho de fazer isso. Não estou tentando mandar recados, mudar o giro do planeta e muito menos conseguir algum lucro com isso. Estou aqui para me satisfazer. Se alguém lê, melhor.

domingo, 9 de agosto de 2009

Segundo Passo

Após escrever e publicar o primeiro passo, texto anterior a esse, estive pensando e pensando e pensando sobre alguns pontos. Um destes é que as pessoas me conhecem como alguém que não tem papas na língua, ou seja, fala o que pensa. Ou seja, se escrevi que me remoia por não conseguir falar algumas coisas a algumas pessoas, como poderia ser conhecido por um camarada que fala pelos cotovelos e que deixa bem claro sua opinião? Eis a resposta.

Sei que falei muito e que carregarei esta marca maldita, fruto da minha falta de sabedoria. Sei também que muito do que falei magoou certamente pessoas muito próximas de mim, que dividiam até certo ponto alguns momentos e alguns projetos. Mas, o ponto a que me refiro no primeiro passo e neste parágrafo é que não disse tudo o que queria, ou pelo menos tudo o que devia ter dito. Na verdade, o que falei e que provocaram mágoas foram coisas ditas da maneira errada, e que nada se referem ao que sentia: falta de parceria.

Meu desespero antigo era ver o barco afundar, saber onde estava o furo na nau e perceber que eu era o único que estava lutando para manter a água fora da proa. Aí sim, acabei deixando escapar palavras e opiniões que em partes expressaram o que sentia. Mas, infelizmente nunca consegui mencionar que me faltavam parceiros, pessoas que dividissem comigo a paixão pela música, pela banda, pelo horário de ensaio, pelo estudo, pela harmonia, pelo sonho de ter um projeto que desse resultado positivo.

Então, se você leu o primeiro passo e pensou “quem vê pensa que ele nunca falou nada pra ninguém”, entenda muito bem que nunca mencionei que me sentia sozinho e abandonado, ou que eu disse apenas uma parte de tudo o que deveria ter dito.

Enfim, após pensar e pensar sobre o que havia escrito no primeiro passo, eu avistei por traz das colinas do meu caminho intelectual o meu segundo passo: polir as arestas de ser conhecido como alguém que sempre falou o que pensa.

No momento, não quero modificar nada do que sou hoje. Não quero mudar este perfil de alguém honesto, franco e verdadeiro. Só não quero ser conhecido como alguém que é precipitado no que vai falar, sem controle e sem domínio próprio.

As palavras possuem forma e ao encaixá-las umas as outras para formarmos nossa opinião, deixamos diversos cantos vivos. Aí entra a sabedoria, que dá polimento a cada aresta, evitando assim mal entendidos. Alguns desentendimentos serão inevitáveis, pois a comunicação depende do emissor e receptor, como já disse antes. Mas, quero pelo menos fazer minha parte.

Aqui fica o início do meu segundo passo.

Primeiro Passo

Há poucos meses participei de um treinamento de líderes num ambiente muito agradável. Estava cercado de gente conhecida, de uma atmosfera que muito me faz feliz, em companhia de meu grande amigo Edu. As palestras eram ministradas por gente do mais alto gabarito, líderes que além de terem autoridade sobre seu tema, tinham o poder de conquistar as pessoas: eram ilustres carismáticos.

Um destes palestrantes, o qual eu já tinha ouvido mais de mil vezes anteriormente, puxou o meu tapete com uma frase. Sua sentença quebrou o meu pilar de apoio e fez-me repensar sobre minha vida. Ele conseguiu algo muito mais profundo do que conquistar minha admiração. Sua opinião mudou minha ótica sobre algumas coisas.

Antes de contar a você o que aconteceu ou o que ouvi nesta palestra, vou relatar mais ou menos como eu norteava minha vida. Eu simplesmente não conseguia contrariar pessoas queridas em alguns assuntos ou situações. E não tinha coragem de cobrar nada, nem mesmo colocar em xeque-mate alguns itens que eu tinha com pessoas que eram por mim estimadas. Raramente eu desaprovava algumas situações justamente porque não queria que partisse de mim a responsabilidade de uma possível mágoa de um amigo querido.

Eu preservava o verniz da amizade e do carinho entre eu e as pessoas que amava, mas por dentro eu me acabava de tamanha não conformidade. Eu não sou moralista, legalista ou perfeccionista. O que me consumia era a falta de parceria para com minhas investidas – coisa que já escrevi anteriormente neste blog. Todos os projetos que circulavam minha cabeça e ambição necessitavam de parceiros: uma banda, um evento, um show, uma peça de teatro, uma gravação, uma composição, o Café Cajuru, uma viagem e etc.

O câncer que aumentava no meu coração era a impiedosa solidão das investidas que fazia. Enquanto eu perdia o sono e a fome por causa da ansiedade de um ensaio, alguém furava indo ao cinema ou sob a condição de partir antes do horário de término. Enquanto eu gastava minhas energias para memorizar partituras, endereços e saldos bancários para finalizarmos uma apresentação, alguém esquecia cifras, convenções e o prazer de fazer algo em conjunto. Eu estava só, mas esta era uma condição que eu havia me colocado nela: a culpa era minha.

Voltando para aquele momento do congresso de líderes...

O palestrante estava abordando um tópico tendo como ilustração a história de um casal que idealizava um jantar semanal para ele. Aquela família recebeu algumas negativas para tal convite, pois ele não podia atender tal oferta conforme desejado. A demanda era maior que o espaço livre em sua agenda. Aquela família estava experimentando certa decepção causada por eles mesmos. A frase com que o palestrante encerrou tal ilustração foi “eles precisam aprender a lidar com sua frustração”.

Essa foi a frase que me marcou. Foi a partir dela que descobri que devia abandonar algumas compulsões minhas, como a grande tendência que tinha de agradar as pessoas, sufocando o que eu realmente era. Eu me inseria numa solidão por falta de parceria, por não saber ampliar meus horizontes, por contar sempre com as mesmas pessoas e tendo como consequência disso tudo o mesmo resultado frustrante. Eu havia criado isso em mim e precisava aprender a lidar com isso.

O meu maior erro era inserir as pessoas em locais onde elas não tinham como oferecer o retorno esperado. Eu criava expectativas, mas infelizmente o rendimento final dependia da condição onde eu as havia colocado em minha mente. Como não conseguia expressar o que realmente sentia, evitando assim magoar alguém, a minha frustração tendia ao infinito. Normalmente, eu estava morrendo na véspera de qualquer realização. Eu precisava mudar.

Ouvi uma vez de um amigo “você nunca vai ter um grupo de Bonys na sua investida”, afirmando que as pessoas eram diferentes e que por essa razão o percentual de comprometimento era diferente para cada um. Não acredito nisso. Não penso que o simples fato de sermos diferentes nos libere da real necessidade de comprometimento e evolução. Não creio que pelo delta de nossas histórias esteja a diferença da paixão pelo realizar.

Ainda não me curei do câncer da falta de parceria. A cura disso não implica somente na minha disposição, mas na de todos os envolvidos. Assim como a comunicação depende tanto do emissor como do receptor, assim também é a realização, a qual depende da parceria formada. A concretização de um projeto é como o sexo: só existe num movimento bilateral, no envolvimento das duas partes, numa relação apaixonada entre ambos.

Mas, até agora eu só consegui visualizar meu primeiro passo: preciso aprender a lidar com minhas frustrações. Já estou mais feliz sabendo disso.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Desapego do Material

Para mim, Jesus demonstrou não ignorar o dinheiro, pois percebo que ele falou de dinheiro o tempo todo. O Filho do Homem ostentou não ter onde repousar a cabeça, mas utilizou o dinheiro e as riquezas para configurar suas parábolas. Se por um lado Jesus condenou a obsessão pelo acumulo de bens materiais, por outro deixou claro que a riqueza é talvez a metáfora mais adequada para o que queria dizer.

Digo isso porque só nos registros do primeiro evangelho, Jesus comparou a recompensa do reino aos denários na parábola de Mateus 20 e ao perdão de uma dívida quitada em Mateus 18. Comentou também que as responsabilidades do reino são como talentos de ouro em Mateus 25. Indo mais além, Jesus comparou o reino ao tesouro enterrado que alguém encontrou e também a pérola preciosa que alguém vendeu tudo o que tinha para adquiri-la. Alertou que o tesouro e o coração ocupam o mesmo lugar em um homem, e que por isso devíamos sempre investir num tesouro no céu.
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Jesus afirmou que não vale à pena investir no material, e em contrapartida nos convidou a desfrutar dele. Lembram quando ele disse “olhai os lírios do campo”, “olhai as aves do céu” ou ainda “este pão é meu corpo e este vinho é meu sangue”? É isso: fazer usufruto.

Se pensarmos como Jesus, ser ganancioso é ser idiota pois correr atrás do material impede-nos de desfrutá-lo. Ele disse que o mais capenga lírio do campo possui guarda roupa melhor que Salomão e que os pássaros comem banquetes melhores que os de Herodes. Assim sendo, podemos concluir que uma caminhada ao lado de quem se ama vale muito mais do que um passeio nos motores de uma Ferrari; viver numa favela em paz é muito mais precioso que viver numa mansão sem conseguir dar e receber carinho.

Considero que ser como Jesus não é ter uma vida que cultiva o ócio, mas sim, ter uma vida que abre mão do autogoverno. Viver como Jesus é necessitar da conexão social, de compartilhar as coisas, da condição de poder dividir e poder receber. É preciso fazer uso das riquezas a fim de fazer novos amigos como está registrado em Lucas 16:9. É usar o dinheiro sem ser usado por ele, é ser generoso como Deus-Pai e pobre como Jesus.

Obviamente que para tudo isso, devemos nos desapegar do material para poder desfrutá-lo. Não quer dizer abrir mão do trabalho e dinheiro, mas sim, ter em mente que alguns pássaros cantam melhores do que os pardais, mas nenhum deles é mais feliz porque canta melhor, mas por serem pássaros livres. Deus os conhece.

Ainda que não pareça lógico, para mim o pobre tem mais condições de desfrutar as boas coisas da vida, simplesmente porque a limitação da sua condição os força a valorizar o momento. E momento é a única coisa que realmente temos.
O material existe para oferecer e por isso devemos desfrutar até mesmo sem nada possuir.