terça-feira, 25 de agosto de 2009

Graça

Quando tinha 8 anos, quebrei o óculos da professora que estava em cima da sua mesa, por estar fazendo bagunça. Aos 13, levei suspensão por ter faltado com o respeito com a professora, cutucando-a por trás com uma caneta esferográfica. Mais de uma vez afanei brinquedos de colegas, tendo que devolvê-los após horas de bronca e surra.

Falsifiquei a assinatura da minha mãe, surrupiei dinheiro para jogar fliperama, quebrei a janela do vizinho atirando uma pedra propositadamente. Subi no telhado da casa da minha avó, usando os galhos de uma goiabeira que crescera mais que o normal, causando desespero aos adultos que assistiam tudo lá de baixo.

Colei nas provas do ginásio e do segundo grau. Escalavrei-me no asfalto mais 100 vezes caindo de bicicleta – uma vez quase fui atropelado pelo caminhão de lixo. Troquei socos com meu irmão, com meus primos, com meus vizinhos. Xinguei adultos e idosos. Fui considerado rebelde mais vezes do que consigo me lembrar.

Aos 12 anos, troquei beijos e abraços escondidos com a vizinha. Aos 18 experimentei cigarro para fazer charme a mesma vizinha. Dirigi meses a fio sem ter carteira de motorista. Bati na traseira de um carro e saí correndo do local do acidente uma vez. Apresentei atestado médico falso para justificar ausência na empresa onde fazia estágio.

Muitas destas atitudes foram sucedidas por enorme sentimento de culpa. Experimentei a sensação do peso na consciência. Morria de medo quando pensava na volta de Jesus. Como poderia eu ser salvo se faço todos estas coisas? Não devia eu ser santo?

A resposta destas indagações talvez eu não consiga oferecer. Há algo de constrangedor na graça da salvação. Há algo humanamente incompreensível no amor de Deus. Eu, pecador miserável, não pude escapar das garras da graça quando a encontrei.


sábado, 22 de agosto de 2009

Maioria

No texto anterior, um holofote foi aceso sobre universo masculino: os homens foram mais privilegiados com resultado obtido no desenvolvimento sócio-cultural de anos e anos. Ainda que o texto escrito não tenha nos seus parágrafos uma leitura social em detrimento a mulher, reconheço que foi jogado confete apenas sobre o homem. Desta forma, aproveito a lacuna para compensar tal situação.

Estatisticamente, as mulheres já estão em maioria dentro das igrejas. Há poucos dias, li um artigo sobre a igreja anglicana, que ordenou pela primeira vez na história, mais mulheres que homens na Inglaterra. Apesar de haver cada vez mais mulheres no sacerdócio, o clero feminino quase não teve impacto devido, principalmente, que a maioria das mulheres trabalha voluntariamente.

Mulheres sofrem mais com a causa alheia por serem mais sensíveis. São intercessoras penitentes, possuidoras de uma fé muito forte. Repartem com mais dedicação o que possuem, multiplicam talentos e oportunidades. Nas ações sociais são mais dedicadas, árduas trabalhadoras. Nos campos missionários, são mais apaixonadas pelas culturas distintas. Nas reuniões de oração, são indispensáveis.

Participei de mais cultos missionários liderados por mulheres do que por homens. Percebi mais doação de dinheiro vinda de mãos femininas do que masculinas. A continuidade de trabalhos como EBD, creches, escolas, assistência social, enfermarias, se deve mais a elas do que a eles.

Se no passado as mulheres foram resignadas ao lar, o resultado necessariamente não foi ruim: a elas foi dada a graça de transmitir o conhecimento a próxima geração. Compromissadas com o lar, a mulher desenvolveu melhor a capacidade de relacionar-se de forma mais profunda, criando um núcleo familiar forte.

As mulheres especializaram-se na esfera de relacionamentos íntimos: expressam mais claramente os sentimentos, distribuem melhor os recursos, tornaram-se cooperativas. É devido a estes fatores, causados pela forma de como a cultura se desenvolveu, que as mulheres tornaram-se indispensáveis nas atividades da igreja. Talvez a igreja fosse totalmente diferente do que é hoje se não houvesse tantas mulheres em pujante participação. Arrisco a pensar que a igreja seria totalmente desumana, se não fosse por elas.

As mulheres já são maioria. Com o passar dos anos, a igreja será cada vez mais feminina.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Seja Homem!

Você já percebeu que uma pessoa adulta do sexo feminino recebe o devido respeito como mulher enquanto o mesmo não ocorre aos homens na maioria das culturas do planeta?

Creio que no senso comum, a honra do título “homem” não é concedida até que o indivíduo do sexo masculino demonstre o seu valor. Trata-se de uma condição de se fazer perceptível, dentro de uma espécie de critério. A sociedade espera dos homens que estes sejam suficientemente provedores de seu próprio sustento – se outra pessoa o faz, este ainda não chegou a ser verdadeiramente homem. Numa segunda expectativa, superior a anterior, o homem deve ter capacidade de gerar determinado provento adicional, sendo assim, capaz de beneficiar outros, como esposa, filhos ou outros dependentes.

Após alguns minutos de consulta ao oráculo Google, encontrei dois artigos, elaborados por estudiosos, que enfatizavam a vertente da sociedade atual: todo homem de verdade deve produzir mais do que consome. Em outras palavras, homem que é homem acumula riqueza.

É preciso lembrar que a cultura explora o homem e a mulher de modos diferentes, e por isso não creio que seja mais difícil ser um ou outro. Uma dessas maneiras exploratórias é exigir que o homem mostre-se sempre merecedor de respeito, provendo sustento para si mesmo e para outros. As mulheres não têm de enfrentar este tipo de desafio, e talvez seja por isso que a maioria dos casos de desalento e depressão no mercado de trabalho é de homens.

Nos tempos mais remotos, as sociedades consideradas evoluídas eram aquelas que possuíam o maior número de integrantes. A reprodução garantia a sobrevivência da espécie numa forma mais perceptível do que é hoje. Neste prisma, a necessidade social era que os úteros fossem maioria sobre os pênis, afinal pouquíssimos homens poderiam fertilizar um bom número de mulheres, garantindo o crescimento da tribo de forma suficiente – o contrário não seria possível. Portanto, as chances eram mais favoráveis para as mulheres, pois bastava a elas serem amáveis e esperar por um homem disposto a fazer sexo.

Como o sucesso estava sendo medido pelo número de herdeiros, para os homens a disputa tornou-se grande na esfera social. Uma mulher já fecundada era como uma vaga preenchida no balcão de empregos, e com isso forçava o homem a lançar-se ao mar, na busca pela conquista de novas terras e novas mulheres. Para vencer, o homem precisou ser inovador, criativo, explorador e com real capacidade de assumir riscos.

Neste ponto, pode-se concluir que descendemos do tipo de homens que fizeram uma viagem arriscada e que voltaram ricos. Somos filhos de mulheres amáveis que se relacionaram com homens que assumiram riscos. Creio que é nesse exato ponto onde se percebe a razão que a sociedade dedica aos homens um reconhecimento maior do que para as mulheres.

Talvez a natureza tenha adequado as mulheres para serem mais amáveis, enquanto os homens foram inclinados para correrem atrás da grandeza. Essa tendência masculina posicionou o homem nas duas extremidades sociais: os homens estão em maior número no governo, nas gerências, nos presídios, nas universidades, no tráfico, nas drogas, na promiscuidade, nos doutorados, no crime organizado e assim por diante. Quem é morto nas guerras? Quem possui profissões com as atividades mais insalubres? Quem são os sem-teto? Quem está no comando? Basicamente, homens.

Eis porque da religião, da literatura, da arte, da ciência, da ação militar, do mercado, da organização política e da medicina terem emergido da esfera masculina. Não é uma questão de habilidade prática muito menos uma conspiração masculina contra as mulheres, mas sim ao fato da cultura ter se desenvolvido essencialmente no modo de relacionamento social, o qual favoreceu os homens.

Nada de Escândalo

Acho que depois que meu caráter e minha fé amadureceram, pouquíssimas coisas (talvez nenhuma) conseguiram causar em mim qualquer tipo de escândalo. Não me espanto mais quando alguém anuncia seu divórcio, quando a filha de outrem engravida antes do casamento ou quando um velho conhecido abandona a igreja.

Numa linha de raciocínio mais clara, afirmo que o pecado não move mais em mim qualquer sentimento relacionado com o escândalo. Em primeira mão, não me espanto mais com o tropeço de alguém (qualquer que seja) evitando assim, não sentir comichão na língua para contar a outra pessoa. Segundo, porque encaro pecado como natureza de apenas um padrão de classificação, ou seja, contar uma mentirinha ou cometer adultério é a mesma coisa – ainda que tenham conseqüências bem distintas. Obviamente, não me concentro no que pode acontecer, bastando a cada dia o seu mal.

Nesta segunda via de pensamento, fica o meu descontentamento e protesto contra as medidas disciplinares que a liderança eclesiástica vem imprimindo. Digo isso porque é sempre exposto ao ridículo e aos açoites aquele pecador que engravidou a namorada, porém o mentiroso e sonegador de impostos recebem, quando muito, o esforço da fofoca e do puxão de orelha. Assim, a única forma que encontro para reagir contra esse grande vacilo dos líderes, é não dando a mínima ao erro que qualquer um pode cometer.

Não acredito muito na história de “fiquei escandalizado”. Quando ouço essa frase, normalmente percebo que é mais um “não gostei disso” ou “não concordo” do qualquer outra coisa. É uma grande cilada, mas apenas para quem esparrama por aí seu pseudo-escândalo.

Já estive numa roda onde o baseado estava aceso, dei carona pra quem não conseguia andar devido ao consumo de álcool, joguei truco em mesa de boteco, participei de churrascos em companhia de ateus e drogados, emprestei dinheiro para vagabundos e lascivos, dancei a noite inteira na festa de aniversário de um amigo que estava lotada de gays, travestis e lésbicas. Não me tornei impuro, não fui influenciado e não cometi nada que desabonasse minha conduta, ainda que esta não seja exemplar. Ao contrário, amei e fui amado por “este tipo gente”, enquanto me mantinha um carola.

Fico estarrecido quando ouço sobre a desnutrição dos pequeninos no sertão, perco o sono quando fico sabendo que um conhecido está com uma doença terminal, choro de raiva com os relatos estatísticos da guerra do Iraque, desespero-me com as notícias da violência doméstica, embrulha-me o estômago saber das trapaças no congresso. Mas, de uns tempos pra cá, nada mais me acontece quando sei de um vacilo espiritual de alguém.

Decidi não dar mais ibope ao pecado. Decidi não ser platéia curiosa do acusador. Decidi não ser o catalisador do peso da consciência de ninguém. Esforço-me apenas para abraçar aquele que reconhece seu erro, que pede socorro, que necessita de ajuda. Que seja eu, um ponto de apoio e intercessão em favor dos pecadores. Já fui acudido por eles um dia.

Que atirem a primeira pedra – estou pronto para cuidar da ferida, seja minha ou de outro alguém.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Encruzilhada

Se estive analisando esses trinta anos de vida que usufruí neste planeta, é porque estou percebendo os rebentos das minhas atitudes. Algumas lanças atiradas para o alto estão volvendo de ponta para baixo, forçando-me no reflexo de esquivar momento após outro.

Percebo que este sobrepeso e sedentarismo cultivados na última década, renderam-me um saldo negativo e, obviamente, não poderia ser diferente do que me é apresentado hoje. Começo a experimentar quase que cientificamente coisas como pimelose, tendinite, apnéia, dislipidemia e triglicerídeo – palavras rebuscadas, mas cujo significado é simples como um susto.

Aprendi na escola que a glicose é uma das principais fontes de energia do organismo, mas quando em excesso, pode trazer várias complicações à saúde. Tenho visto nos noticiários que existem mais 300 milhões de obesos no mundo, um terço deles estão nos países desenvolvidos. A obesidade é vista cada vez mais como um crescente problema de saúde pública, pois predispõe o organismo a uma série de doenças, em particular doença cardiovascular, diabetes e osteoartrite.

Outro assunto que circula no meu cotidiano e nas manchetes dos jornais é a questão do estresse. Ele pode iniciar-se por uma demasiada ansiedade e/ou por uma mudança brusca no estilo de vida. Ambas as situações levam a pessoa a sentir um determinado tipo de angústia. No prolongamento dos sintomas de estresse, além dos sentimentos de evasão, os mecanismos de defesa passam a não responder de maneira eficaz, aumentando assim a possibilidade de vir a ocorrer doenças.

Encontro-me numa encruzilhada. O caminho que escolhi levou-me a um ponto sem retorno, tendo exatamente três opções a minha frente: sigo em frente e continuo como se nada tivesse acontecido, dobro para a direita conservadora e inicio um regime alimentar combinado com algum medicamento, ou viro à esquerda revolucionária e entro no processo de preparação da cirurgia bariátrica. Em minha mente só há uma mensagem: não siga em frente!

Tenho medo da revolução. Decepcionei-me com Che Guevara quando este afirmou que acreditava na luta armada. Esta opção esquerda, ainda que seja eu um simpatizante, não me transmite paz. E não se deve esperar outra postura de um sedentário. Optar pelo caminho que faça menos agressão ao corpo é um pensamento de gordo.

A consulta médica marcada para esta terça-feira passada, revelou minha situação de saúde. Tenho o resultado dos exames nas mãos e uma tabela que indicam que meus números não estão bons. Tenho quase 30 anos, mais de 120 quilos, uma esposa e duas filhas. Tenho que fazer algo melhor para meu corpo.



A cabeça está em ordem, obrigado.

domingo, 16 de agosto de 2009

Discípulo

Escrevi anteriormente sobre exemplos: ícones que brotaram no deserto da humanidade. Fiquei pensando numa frase de Gandhi: se os cristãos realmente vivessem de acordo com os ensinamentos de Cristo, como descritos na Bíblia, toda Índia seria cristã hoje. Em seguida lembrei que basta o discípulo ser com o seu mestre.

Este rebuliço de frases e idéias fizeram-me pensar um pouco sobre como é difícil ser um seguidor de Jesus. Como ser um imitador do maior de todos os exemplos? Como imitar alguém inimitável? Como ser discípulo de Cristo sem ser ofuscado por sua glória?

Quanto mais admirável o exemplo, mais difícil torna-se imitá-lo. Isso porque, paradoxalmente, quanto mais brilho o exemplo possuir, maior será a sombra que seu discípulo fará projeção. Quanto mais integridade o exemplo demonstrar, mais iniqüidade o discípulo apresentará. Isso se dá inevitavelmente pela proximidade junto ao mestre. Mas, há um pequeno detalhe e é esse o meu gancho para este texto.

A obra de Jesus estava apenas iniciada e cabia a seus discípulos continuar suas maravilhas aqui na terra. E sendo assim, deixou apenas uma recomendação: que não se dispersassem até que o espírito fosse derramado. E assim eles fizeram, formaram uma união nunca antes experimentada e essa foi o primeiro passo rumo a solução do dilema: como imitar Jesus.

Com a aproximação, surgiu a primeira comunidade cristã. Neste ajuntamento, eles tiveram que visualizar o segundo passo do seguidor de Jesus. Tiveram que aprender a ceder, acolher, aceitar, dividir e muito mais que tudo isso junto, a amar incondicionalmente. Jesus, na maioria das vezes concedia importância muito secundária a seus milagres, preferia evitá-los ou mantê-los em segredo. O enfoque do messias era uma espiritualidade desenvolvida na esfera do toque, na proximidade, na amizade.

O segundo passo que os apostos tomaram, foi deixar de considerar que a faceta mais digna de admiração do ministério de Jesus foram seus milagres e não seu caráter, seu ensino, seu infinito amor e desconcertante perdão. Assim, estando eles imbuídos pelo espírito e totalmente transtornados pelo exemplo demonstrado passo a passo por Jesus, encontraram a solução.

Ser um verdadeiro seguidor de Jesus era desejar o que ele desejou: coisa alguma. Cristo esteve presente na terra e esteve unido com seu povo, falou na língua deles, dormiu na cama dos cobradores de impostos, sentou à mesa com pecadores e por assim ser, passou uma mensagem de inclusão a seus discípulos. Porém, ao manifestar seus milagres, ressaltava “não conte isso a ninguém”.

Cristo não procurou fama, não buscou notoriedade. É por isso que há mais registros dele falando “vá para sua casa” do que “venha me seguir”. Seu ministério foi desenvolvido na proximidade, fazendo uma inclusão de todos à graça do Pai por meio de seu sangue.

Aquele que abraça a todos sem distinção, que transmite tranqüilidade e perdão a qualquer um, que abençoa e que em nenhum momento deixa isso transparecer, este é o verdadeiro seguidor de Jesus. Aquele que reconhece como maior valor o abraço do que um milagre sobrenatural, este é o verdadeiro seguidor de Jesus.

sábado, 15 de agosto de 2009

A Voz dos Exemplos

Exemplos são raros, mas são suficientes. Poucas pessoas deixaram marcas numa geração, num país ou num movimento. Ainda que poucos foram os que tiveram privilégio de estar próximo de um ícone, o mundo inteiro recebeu os traços da radiação de grandes exemplos, devido sua determinação.

Falo de gente como Madre Tereza, que ao perceber a condição de miséria das crianças, mulheres e idosos na Índia, tornou-se missionária e enfermeira para melhorar condição destes. Idealistas como Martin Luther King, que lutou pelos direitos civis de negros e mulheres através da não-violência e de amor para com o próximo. Líderes como Gandhi, que unificou hindus e muçulmanos na luta pela independência de seu país, estando disposto até em morar nas ruas sujas com os pobres se necessário fosse. Corajosos como Nelson Mandela, que não aceitou o regime apartheid de segregação racial, condicionando-se como prisioneiro pela recusa em incentivar a luta armada.

Muito mais que o brilho do verniz destes exemplos, é a abdicação das condições normais que possuem em prol da conquista de seu ideal. Dedicação extrema a algo que não é interesse particular, mas sim de bem comum a todos. Casos impressionantes como o de Thich Quang Duc, que chegou a abrir mão de sua própria vida para chamar a atenção do mundo para os abusos feitos contra seu povo, ecoam geração após geração. Histórias como de Simone Weil, que deixou de comer protestando contra as condições em que eram mantidos os prisioneiros de guerra na França ocupada, vindo a falecer em sua greve de fome.

Creio que exemplos são poucos porque determinação para o bem é elemento raro na natureza humano. Somos inclinados e doutrinados na individualidade. Dificilmente conseguimos pensar em algo que seja comum a todos, dificilmente conseguimos entender que o lucro está em não ter lucro algum.

Abram os ouvidos, pois a voz dos exemplos ainda fala bem alto.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Trinta

Aos poucos envelheço, mas não me considero velho e muito menos antiquado. Relaciono-me bem com os que são juvenis hoje, conheço sua linguagem, sua música, sua bandeira. Envelheço e sou ainda tão jovem. Não tenho idade para deixar de existir, mas tenho para assumir as conseqüências de meus atos. Tornei-me um adulto.

Casei com a primeira mulher que disse que me amava. Conheci-a aos 16, a pedi em namoro aos 20, em casamento aos 26 e hoje aos 30 eu só lhe peço que cuide de mim. Ao unir-me com ela, aprendi a dividir coisas como tempo, dinheiro, espaço e liberdade. Passei a compreender, ainda que parcialmente, costumes e dificuldades estranhos. Comecei a investir qualidade de tempo para cuidar de corpos e corações. Ao unir-me com minha esposa passei a ser responsável por uma família: cresci como ser humano.

O casamento, além de me proporcionar condições de crescimento social e espiritual, presenteou-me com duas filhas. Foi através da experiência da paternidade que entendi o quanto devemos amar incondicionalmente uns aos outros. Minhas filhas retribuem com sorrisos e beijos o suor do meu rosto. Se eu agisse conforme o pensamento vigente deste mundo, elas estariam em grande dívida comigo, mas não é assim que as coisas devem ser. Eu gasto tempo e dinheiro, abro mão de planos e desejos de consumo, invisto em coisas que não são de meu interesse, simplesmente pela necessidade delas. E me satisfaço com isso. Não espero receber nada em troca. Quem me dera que o planeta estivesse cheio de pessoas agindo em prol da subsistência das outras sem esperar retorno.

Envelheço dia a dia. Os cabelos já se apresentam em menor número, as marcas e sulcos no rosto já são um pouco mais indiscretas e os calcanhares se enrijecem feito pedra-pome. Ainda que sinais como estes apareçam no espelho, ainda não tornei um velho. Creio estar iniciando a travessia da ponte da meia-idade, sou novo demais para afirmar vivência e maturidade, sou velho demais para relaxar e não arregaçar as mangas.

Quando criança era totalmente dependente. Até mesmo para poder me alimentar dependia das mãos do meu pai e do cuidado de minha mãe. Com o passar dos anos, comecei a dividir timidamente as despesas com minha mãe, mas ainda não era responsável por nada. Hoje, após ter recebido sustento por mais de 20 anos, assumi o papel do supridor, de quem atende as necessidades de um lar.

Balancei as flâmulas da mocidade deixando para traz as pegadas da infância, troquei as bermudas por calças jeans, deixei o cabelo e a barba crescer, passei a usar título de eleitor, shampoo anticaspa e gravata, mudei o turno escolar, substituí a teimosia infante por palavrões.

Em 30 anos de vida experimentei crescimento físico, emocional e espiritual. Não estou nem velho nem novo. Passei para a fase que só existe para delimitar os grupos de idosos e jovens.

quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Fama: consumismo maldito

Depois de meses de recuperação de um tratamento intensivo contra a evolução de um tumor, ocorreu um acidente de trânsito que o deixaram impossibilitado de trabalhar. Estes episódios fadaram Paul Potts a acumular uma dívida suntuosa e a encarar posteriormente o trabalho de vendedor de celulares para poder se manter. Manteve em segredo sua inscrição no “Britain’s Got Talent”, programa do ano de 2007 em que saiu como o grande vencedor, aclamado por milhões, revelado como grande estrela. Paul Potts tornou-se celebridade.

Com o passar dos dias, Potts adquiriu involuntariamente o fungo mortal da fama. A celebridade traz sempre este verme maldito em seu verniz: quem a adquire leva em conjunto a fama e somente uma dose de integridade e desapego ao material pode manter alguém praticamente ileso de seus efeitos nocivos.

A fama é como um câncer que consome os tecidos da humanidade; transforma o ídolo em alimento e o público em estômagos insaciáveis. Gente como Michael Jackson ou os Beatles perderam muito mais que a vida pública. Perderam o direito de opinar sobre assuntos delicados, perderam a oportunidade de errar, perderam a simplicidade de apenas não fazer nada.

O público consome tudo. Se o ídolo decide não viajar mais, é questionado por tal opção. Se o ídolo emagrece repentinamente, é indagado sobre substâncias ou viroses que por ventura venham a correr em suas veias. Se o ídolo possui excentricidades, recebe holofotes e colunas dedicadas a ressaltar suas nuances.

Nas primeiras transmissões do programa, Paul Potts não demonstrou confiança e não apresentou boa aparência. Potts chamou a atenção por sua exímia apresentação e extensão vocal. Seu talento pôde aflorar sozinho na primeira audição porque não havia o que dividisse espaço com ele como beleza, moda, carisma e muito menos fama. Competiu etapa por etapa e venceu o programa cantado ópera, língua que não é de domínio geral, não é normalmente apreciada por quem assiste concurso de calouro.

É apenas no período anterior a ascensão repentina de Potts, que o público realmente dedicou ao seu consumível alguma espécie de carinho. O público, ao ver um homem franzino, feio, não confiante e desengonçado, identifica-se imediatamente. Potts tornou-se momentaneamente um espelho, suas incompetências representavam uma multidão aglutinada em sofás e cadeiras posicionados do outro lado da tela do televisor.

Incorporado o tempero da fama, homens transformam-se em ídolos e fãs, e posteriormente em ração e animal respectivamente. Qualquer imagem, qualquer nota, qualquer informação, ainda que de fontes mentirosas, servem de alimento ao público-parasita.

Se Potts retornou a vender celulares ou está em turnê mundial, ainda não percebi nada nos canais de informação. Forço-me apenas saber como está sua vida. Não quero incorporar o perfil do público-parasita, não quero descriminar as escolhas ou os tropeços de alguém exatamente igual a mim. Já me é suficiente conhecer que um homem realizou maravilhas sem qualquer ajuda da fama.

terça-feira, 11 de agosto de 2009

O Deus que Creio

Deus está muito acima das idéias e imagens que possamos ter sobre ele.

Eu acredito em Deus. Porém, não acredito que o futuro é imutável, que tudo o que aconteceu e acontecerá estão devidamente cadastrados num banco de dados divinos. Creio que nosso livre arbítrio em associação com a intervenção divina pode construir um futuro diferente.

Eu acredito em Deus, mas não acredito que ele opera milagres de forma seletiva, entregando dádivas apenas a quem ora ou quem cumpre mandamentos bíblicos. Se assim fosse, Deus estaria fazendo acepção de pessoas, pois abençoaria uns e amaldiçoaria outros. Se assim fosse, Deus seria o responsável pelo sossego da vida de políticos corruptos e empresários gananciosos, possuidores de contas bancárias rechonchudas. Se assim fosse, Deus estaria negligenciando cuidado aos pequeninos que sofrem abusos nas mãos de homens violentos e as crianças que padecem de fome e sede nas regiões mais pobres do planeta. Se assim fosse, Deus seria alguém muito estranho: atenderia uns e não atenderia outros. Qual seria o critério divino?

Eu acredito em Deus, mas deixei de acreditar que a devoção a ele nos traz uma vida isenta de intempéries. Não consigo engolir que a igreja tenha a função de tornar os dias mais leves através do acesso ao sobrenatural. Não suporto mais aquela a fé de cunho preventivo, aquelas orações feitas para evitar percalços e aquele tipo de gente que afirma que os salvos recebem livramento das adversidades. Não creio num Deus parcial, que se move apenas ao ouvir orações vindas de crentes.

Não acredito que Deus está no controle de tudo, ainda que tenha pleno poder para assim proceder. Não posso acreditar que a vida roubada daquela criança atirada pela janela teve uma permissão divina. Se assim fosse, Deus seria responsável pela falta de bom senso dos pais que decidiram jogá-la de lá. Para mim, Deus não permite furacões e enchentes que matam milhares, balas perdidas que deixam inválidos, crises econômicas que implicam na fome de milhões de famílias. É nossa a responsabilidade pelo trânsito violento, pela política corrupta, pelas doenças sexualmente transmissíveis, pelas síndromes, crises e epidemias. Nós somos os culpados.

Visualizo o meu dia de forma bem tímida, minuto após minuto. Preparo-me para o futuro de maneira simples, exigindo competir sem qualquer privilégio por ser “filho do rei”, aperfeiçoando-me com a medida que posso alcançar. Creio que a benção cai do céu para justos e injustos, e é por isso que não peço a Deus aquilo que ele já está imbuído de me oferecer diariamente.

Acredito num Deus poderoso, que me ama de maneira incondicional assim como ao budista, ao espírita, ao católico, ao hare krishna e aos demais de todos os matizes. Não me coloco em posição de destaque espiritual, nem ao menos me considero mais próximo da graça do que qualquer outro, cristão ou não-cristão.

Deus está muito acima das idéias e imagens que possamos ter sobre ele.
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Espiritualidade à Flor da Pele

Nos últimos tempos, venho percebendo que a maior parte do que é comunicado sobre espiritualidade é sempre algo relacionado às esferas não humanas, a coisas e situações que nada tem conexão com a carne. E não é por menos: cresci ouvindo sobre a luta entre o espírito e a carne, e nesta rotina infectei-me com certa aversão aos impulsos de minha natureza. Os testemunhos que escutei em maioria traziam a associação de espiritualidade com maravilhas, milagres e dons espirituais, confinando assim a amizade, o amor e a compaixão num plano inferior.

O senso comum absorveu a espiritualidade como algo distante da vida normal, gerando confusão entre o desejo de nos aproximarmos de Deus e o estado de sermos conforme nossa natureza. Desta forma, ações foram classificadas em uma espécie de escaninho de entrada e saída: ler a bíblia é espiritual, assoviar não; cantar no coral é espiritual, dançar não; dar o dízimo é espiritual, manter a casa limpa não; jejuar é espiritual, receber um amigo para jantar não; vida devocional de um casal de namorados é espiritual, seu beijo não.

Cristo deixou claro que lidava com corpos e não com espíritos, pois não ignorava os embaraços da carne como doença, fome, dor, decrepitude ou morte. Ele esteve exposto a fome, ao medo, a sede, ao toque, ao beijo, e não recusou tal condição humana. A natureza divina de Jesus estava MANIFESTA NA CARNE e por isso ele exercia sua espiritualidade na esfera do toque, da visão, do tato, da presença, da companhia, do sabor, da voz, dos elementos, dos alimentos, dos abraços.

Jesus não apenas tolerou estar inserido como também não aboliu a carne: ele a redimiu! É pregado exacerbadamente que a espiritualidade é terreno exclusivo da vida devocional, da meditação, do jejum, da leitura, do discurso. Dificilmente é compreendida a espiritualidade num abraço, num beijo, numa declaração de amor, numa caminhada, num pedaço de pão compartilhado, numa flor recebida, num encontro em dia de sol.

Somos constantemente comunicativos sobre a importância de morrer e ressuscitar como Jesus, mas não há comunicação alguma para o passo maravilhoso que Jesus fez em direção a carne para santificá-la.
Vá e pregue o evangelho. Se necessário, use palavras.

segunda-feira, 10 de agosto de 2009

Caminho da Fé

Tomando o gancho da pergunta que fiz para mim mesmo, respondida no texto anterior a esse, lembrei-me de uma situação muito interessante onde eu fui questionado se realmente sei onde vou chegar com a minha fé.

Uma pergunta dessas precisa de tempo de maturação para ser respondida, pelo menos para que eu me satisfaça com a resposta que venha oferecer. Forço neste momento a mente e aos vocábulos para equalizar algo que considero uma boa resposta àquela indagação, que pelo menos me satisfaça.

Não sei qual é o caminho da minha fé porque não gasto mais energia para visualizar o futuro. Não faço mais projeções do que poderei angariar com o empenho da minha devoção a Deus. Eu vivo assim porque quero desfrutar o momento: quero desenvolver e experimentar a fé a cada momento. Dedico-me ao hoje e isso me basta.

Não sei qual é o caminho da minha fé porque fito os meus olhos a menos de um palmo de distância, não desejando ver o que vem pela frente. Contento-me em apenas manter os passos firmes, não vacilantes, sempre em frente. Ainda que seja um andar lento e infantil, sinto-me agraciado por Deus, pois percebo que assim aproveito melhor a jornada.

Se não sei qual é o caminho da minha fé é porque sei certamente quais são os caminhos que não quero trilhar. Fujo das linhas que norteiam uma espiritualidade desconectada da vida normal. Desvio os meus pés destes atalhos, onde a vida espiritual é entendida como cantar um hino, mas acolher um mendigo não.

Encaro a espiritualidade pela redenção que Cristo trouxe a carne. O Messias sentiu fome e sede, esteve exposto ao sangue e ao hálito de acusadores, abraçou, sangrou e morreu – ele, sendo Deus, viveu exatamente como eu e você, sem rejeitar a carne. E é por essa razão que minha fé segue a trilha dos sentidos: um abraço diz muito mais que uma oração, uma carona abençoa muito mais que uma imposição de mãos, um beijo alenta muito mais que um momento de intercessão.

Não me preocupo se sou marcha lenta, não estou competindo. Não acredito que a vida devocional seja uma espécie de maratona, tendo Deus no final da linha segurando a faixa para os primeiros colocados. Meu anseio é pelo que pode acontecer agora, pela beleza do momento, por tudo o que pode acontecer numa visita de um amigo ou no abraço carinhoso de minha filha.
Louvo a Deus por cada ação de felicidade.

Sentido Funcional

Fiz uma pergunta a mim mesmo: onde quero chegar com este blog? A resposta veio quase que de maneira imediata. Não quero chegar a lugar nenhum. Não quero ganhar nada, nem mesmo reconhecimento. Não quero ser levado em conta, não quero seguidores, não quero notoriedade, não quero fama. Escrevo por duas razões simples e é por elas serem assim deste jeito que continuo nesta lida.

A primeira razão que invisto tempo para escrever é porque sinto prazer nisto. Sinto-me bem quando consigo capturar palavras, encaixando-as umas as outras para que assim expressem minhas idéias. Alivio o peso da minha ansiedade em ser ouvido quando consigo finalizar um texto. A segunda razão é mais simples ainda: dedico-me neste blog porque quero que as pessoas leiam o que escrevo.

Em outras palavras, o objetivo do meu investimento neste endereço eletrônico é nada mais do que a única coisa disponível para se fazer aqui: eu escrevo e alguém lê. Algumas variantes podem ser acrescentadas como a possibilidade de inserir comentários, recurso disponível nesta página, mas estes são apenas cosméticos ao verdadeiro sentido funcional do blog.
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Não posso negar que gostaria muito de ver algumas participações como a inauguração dos comentários. Em geral, o que deposito aqui são abstrações sobre minhas experiências vividas, e isto tudo seria muito mais interessante com as interações possíveis enviadas pelo canal dos comentários.

Enfim, senhoras e senhores, se estou aqui escrevendo algo é antes de qualquer coisa pelo prazer que tenho de fazer isso. Não estou tentando mandar recados, mudar o giro do planeta e muito menos conseguir algum lucro com isso. Estou aqui para me satisfazer. Se alguém lê, melhor.

domingo, 9 de agosto de 2009

Segundo Passo

Após escrever e publicar o primeiro passo, texto anterior a esse, estive pensando e pensando e pensando sobre alguns pontos. Um destes é que as pessoas me conhecem como alguém que não tem papas na língua, ou seja, fala o que pensa. Ou seja, se escrevi que me remoia por não conseguir falar algumas coisas a algumas pessoas, como poderia ser conhecido por um camarada que fala pelos cotovelos e que deixa bem claro sua opinião? Eis a resposta.

Sei que falei muito e que carregarei esta marca maldita, fruto da minha falta de sabedoria. Sei também que muito do que falei magoou certamente pessoas muito próximas de mim, que dividiam até certo ponto alguns momentos e alguns projetos. Mas, o ponto a que me refiro no primeiro passo e neste parágrafo é que não disse tudo o que queria, ou pelo menos tudo o que devia ter dito. Na verdade, o que falei e que provocaram mágoas foram coisas ditas da maneira errada, e que nada se referem ao que sentia: falta de parceria.

Meu desespero antigo era ver o barco afundar, saber onde estava o furo na nau e perceber que eu era o único que estava lutando para manter a água fora da proa. Aí sim, acabei deixando escapar palavras e opiniões que em partes expressaram o que sentia. Mas, infelizmente nunca consegui mencionar que me faltavam parceiros, pessoas que dividissem comigo a paixão pela música, pela banda, pelo horário de ensaio, pelo estudo, pela harmonia, pelo sonho de ter um projeto que desse resultado positivo.

Então, se você leu o primeiro passo e pensou “quem vê pensa que ele nunca falou nada pra ninguém”, entenda muito bem que nunca mencionei que me sentia sozinho e abandonado, ou que eu disse apenas uma parte de tudo o que deveria ter dito.

Enfim, após pensar e pensar sobre o que havia escrito no primeiro passo, eu avistei por traz das colinas do meu caminho intelectual o meu segundo passo: polir as arestas de ser conhecido como alguém que sempre falou o que pensa.

No momento, não quero modificar nada do que sou hoje. Não quero mudar este perfil de alguém honesto, franco e verdadeiro. Só não quero ser conhecido como alguém que é precipitado no que vai falar, sem controle e sem domínio próprio.

As palavras possuem forma e ao encaixá-las umas as outras para formarmos nossa opinião, deixamos diversos cantos vivos. Aí entra a sabedoria, que dá polimento a cada aresta, evitando assim mal entendidos. Alguns desentendimentos serão inevitáveis, pois a comunicação depende do emissor e receptor, como já disse antes. Mas, quero pelo menos fazer minha parte.

Aqui fica o início do meu segundo passo.

Primeiro Passo

Há poucos meses participei de um treinamento de líderes num ambiente muito agradável. Estava cercado de gente conhecida, de uma atmosfera que muito me faz feliz, em companhia de meu grande amigo Edu. As palestras eram ministradas por gente do mais alto gabarito, líderes que além de terem autoridade sobre seu tema, tinham o poder de conquistar as pessoas: eram ilustres carismáticos.

Um destes palestrantes, o qual eu já tinha ouvido mais de mil vezes anteriormente, puxou o meu tapete com uma frase. Sua sentença quebrou o meu pilar de apoio e fez-me repensar sobre minha vida. Ele conseguiu algo muito mais profundo do que conquistar minha admiração. Sua opinião mudou minha ótica sobre algumas coisas.

Antes de contar a você o que aconteceu ou o que ouvi nesta palestra, vou relatar mais ou menos como eu norteava minha vida. Eu simplesmente não conseguia contrariar pessoas queridas em alguns assuntos ou situações. E não tinha coragem de cobrar nada, nem mesmo colocar em xeque-mate alguns itens que eu tinha com pessoas que eram por mim estimadas. Raramente eu desaprovava algumas situações justamente porque não queria que partisse de mim a responsabilidade de uma possível mágoa de um amigo querido.

Eu preservava o verniz da amizade e do carinho entre eu e as pessoas que amava, mas por dentro eu me acabava de tamanha não conformidade. Eu não sou moralista, legalista ou perfeccionista. O que me consumia era a falta de parceria para com minhas investidas – coisa que já escrevi anteriormente neste blog. Todos os projetos que circulavam minha cabeça e ambição necessitavam de parceiros: uma banda, um evento, um show, uma peça de teatro, uma gravação, uma composição, o Café Cajuru, uma viagem e etc.

O câncer que aumentava no meu coração era a impiedosa solidão das investidas que fazia. Enquanto eu perdia o sono e a fome por causa da ansiedade de um ensaio, alguém furava indo ao cinema ou sob a condição de partir antes do horário de término. Enquanto eu gastava minhas energias para memorizar partituras, endereços e saldos bancários para finalizarmos uma apresentação, alguém esquecia cifras, convenções e o prazer de fazer algo em conjunto. Eu estava só, mas esta era uma condição que eu havia me colocado nela: a culpa era minha.

Voltando para aquele momento do congresso de líderes...

O palestrante estava abordando um tópico tendo como ilustração a história de um casal que idealizava um jantar semanal para ele. Aquela família recebeu algumas negativas para tal convite, pois ele não podia atender tal oferta conforme desejado. A demanda era maior que o espaço livre em sua agenda. Aquela família estava experimentando certa decepção causada por eles mesmos. A frase com que o palestrante encerrou tal ilustração foi “eles precisam aprender a lidar com sua frustração”.

Essa foi a frase que me marcou. Foi a partir dela que descobri que devia abandonar algumas compulsões minhas, como a grande tendência que tinha de agradar as pessoas, sufocando o que eu realmente era. Eu me inseria numa solidão por falta de parceria, por não saber ampliar meus horizontes, por contar sempre com as mesmas pessoas e tendo como consequência disso tudo o mesmo resultado frustrante. Eu havia criado isso em mim e precisava aprender a lidar com isso.

O meu maior erro era inserir as pessoas em locais onde elas não tinham como oferecer o retorno esperado. Eu criava expectativas, mas infelizmente o rendimento final dependia da condição onde eu as havia colocado em minha mente. Como não conseguia expressar o que realmente sentia, evitando assim magoar alguém, a minha frustração tendia ao infinito. Normalmente, eu estava morrendo na véspera de qualquer realização. Eu precisava mudar.

Ouvi uma vez de um amigo “você nunca vai ter um grupo de Bonys na sua investida”, afirmando que as pessoas eram diferentes e que por essa razão o percentual de comprometimento era diferente para cada um. Não acredito nisso. Não penso que o simples fato de sermos diferentes nos libere da real necessidade de comprometimento e evolução. Não creio que pelo delta de nossas histórias esteja a diferença da paixão pelo realizar.

Ainda não me curei do câncer da falta de parceria. A cura disso não implica somente na minha disposição, mas na de todos os envolvidos. Assim como a comunicação depende tanto do emissor como do receptor, assim também é a realização, a qual depende da parceria formada. A concretização de um projeto é como o sexo: só existe num movimento bilateral, no envolvimento das duas partes, numa relação apaixonada entre ambos.

Mas, até agora eu só consegui visualizar meu primeiro passo: preciso aprender a lidar com minhas frustrações. Já estou mais feliz sabendo disso.

quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Desapego do Material

Para mim, Jesus demonstrou não ignorar o dinheiro, pois percebo que ele falou de dinheiro o tempo todo. O Filho do Homem ostentou não ter onde repousar a cabeça, mas utilizou o dinheiro e as riquezas para configurar suas parábolas. Se por um lado Jesus condenou a obsessão pelo acumulo de bens materiais, por outro deixou claro que a riqueza é talvez a metáfora mais adequada para o que queria dizer.

Digo isso porque só nos registros do primeiro evangelho, Jesus comparou a recompensa do reino aos denários na parábola de Mateus 20 e ao perdão de uma dívida quitada em Mateus 18. Comentou também que as responsabilidades do reino são como talentos de ouro em Mateus 25. Indo mais além, Jesus comparou o reino ao tesouro enterrado que alguém encontrou e também a pérola preciosa que alguém vendeu tudo o que tinha para adquiri-la. Alertou que o tesouro e o coração ocupam o mesmo lugar em um homem, e que por isso devíamos sempre investir num tesouro no céu.
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Jesus afirmou que não vale à pena investir no material, e em contrapartida nos convidou a desfrutar dele. Lembram quando ele disse “olhai os lírios do campo”, “olhai as aves do céu” ou ainda “este pão é meu corpo e este vinho é meu sangue”? É isso: fazer usufruto.

Se pensarmos como Jesus, ser ganancioso é ser idiota pois correr atrás do material impede-nos de desfrutá-lo. Ele disse que o mais capenga lírio do campo possui guarda roupa melhor que Salomão e que os pássaros comem banquetes melhores que os de Herodes. Assim sendo, podemos concluir que uma caminhada ao lado de quem se ama vale muito mais do que um passeio nos motores de uma Ferrari; viver numa favela em paz é muito mais precioso que viver numa mansão sem conseguir dar e receber carinho.

Considero que ser como Jesus não é ter uma vida que cultiva o ócio, mas sim, ter uma vida que abre mão do autogoverno. Viver como Jesus é necessitar da conexão social, de compartilhar as coisas, da condição de poder dividir e poder receber. É preciso fazer uso das riquezas a fim de fazer novos amigos como está registrado em Lucas 16:9. É usar o dinheiro sem ser usado por ele, é ser generoso como Deus-Pai e pobre como Jesus.

Obviamente que para tudo isso, devemos nos desapegar do material para poder desfrutá-lo. Não quer dizer abrir mão do trabalho e dinheiro, mas sim, ter em mente que alguns pássaros cantam melhores do que os pardais, mas nenhum deles é mais feliz porque canta melhor, mas por serem pássaros livres. Deus os conhece.

Ainda que não pareça lógico, para mim o pobre tem mais condições de desfrutar as boas coisas da vida, simplesmente porque a limitação da sua condição os força a valorizar o momento. E momento é a única coisa que realmente temos.
O material existe para oferecer e por isso devemos desfrutar até mesmo sem nada possuir.

domingo, 2 de agosto de 2009

Até Que Numa Noite

PRIMEIRA PARTE

A idéia de escrever regularmente me perseguia há alguns anos. Isso porque eu sentia e ainda sinto muito prazer ao colocar em palavras escritas minhas idéias. Neste mesmo intervalo de tempo, a leitura de coisas interessantes também serviu de catalisador para uma maior regularidade de minha atividade de escrever. Outros fatores também fortaleceram o meu interesse de tornar em ato regular meu prazer pela escrita, como por exemplo, a facilidade de se criar um blog.

Ter um blog abriria as portas para depositar idéias interessantes, pois ao se cadastrar como usuário de um domínio digital, eu teria pelo menos a obrigação de mantê-lo atualizado, ou seja, encontrar tempo de qualidade para escrever mais e mais. Ter um blog também escancararia as janelas sociais para que os textos selecionados fossem expostos para um público indefinido: navegantes digitais, conhecidos ou não, que por uma razão ou outra viessem a ler aquilo que eu registrava com palavras. Com certeza se escreve para que se tenha registro e para que outros possam ler.

Resisti por certo tempo a tentação de um blog, pois o trabalho e a faculdade consumiam com impulsividade a qualidade de tempo que eu presumia necessária para escrever. Amigos meus lançaram nas ondas da internet suas idéias e alguns foram muito bem sucedidos, como por exemplo, o Brabo (www.baciadasalmas.com). Outros não tiveram tal notoriedade e nem sentiram falta dela como o Edu (www.acordespravida.blogspot.com), que retomou a investida de seu blog há poucos dias. Eu, sentado no meu canto, gostava da idéia, mas não tomava coragem para iniciar tal empreitada.

Até que numa noite...


SEGUNDA PARTE

Um dos meus heróis é Mohandas Karamchand Gandhi – o Mahatma, “grande alma”. Um homem franzino e teimoso, que mobilizou milhões com um ideal simples e não-violento. O gênio Albert Einstein declarou que “as gerações por vir terão dificuldade em acreditar que um homem como este realmente existiu e caminhou sobre a Terra”, após assistir o enterro de Gandhi. Pretendo escrever mais sobre ele, dedicando um texto exclusivo, mas agora não.

O que quero deixar registrado nesta segunda parte é que Mahatma Gandhi considerava o silêncio algo muito especial. Há duas frases (dois pensamentos) atribuídas a ele que mexeram comigo, que escreverei logo abaixo.

[1] “Aqueles que têm um grande autocontrole, ou que estão totalmente absortos no trabalho, falam pouco. Palavra e ação juntas não andam bem. Repare na natureza: trabalha continuamente, mas em silêncio”.

[2] "O silêncio já se tornou para mim uma necessidade física espiritual. Inicialmente escolhi-o para aliviar-me da depressão. A seguir precisei dele para escrever. Após havê-lo praticado por certo tempo, descobri seu valor espiritual, dando-me conta de que eram esses momentos em que melhor podia comunicar-me com Deus. Agora sinto-me como se tivesse sido feito para o silêncio.”

Foi mais ou menos com estas duas frases que reuni forças para meditar sobre minha vida neste ano de 2009. Já escrevi isto num texto anterior, mas repito aqui que este ano foi o que mais investi tempo para pensar sobre tudo o quanto já havia experimentado. Foi através do silêncio que pude entender-me um pouco mais.

Foi numa noite dessas em que separei algumas horas para ficar em silêncio, que resolvi escrever sobre mim e sobre muito mais, registrando tudo num site qualquer.


CONCLUSÃO

Após reconhecer o valor espiritual do silêncio e as facilidades oferecidas pela web de se divulgar as idéias, nasceu este blog. Com ele em atividade, eu simplesmente forço-me a encontrar tempo de qualidade para escrever, pois quero que ele esteja sempre atualizado. Obtenho prazer quando consigo fechar ou concluir uma idéia que fervilha em minha cabeça. Sinto-me aliviado quando exponho o que penso ou o que acredito. Por isso, dedicarei tempo de qualidade a atividade de escrever.

Espero não estar enganado com este meu ímpeto.